Relatórios recentes de organizações não governamentais (ONGs) revelam que, apesar do escrutínio internacional, as violações dos direitos humanos na Venezuela continuaram durante todo o ano de 2021, gerando um alto número de vítimas.
“Policiais e militares causaram a morte de 1.414 pessoas em todo o território nacional, entre janeiro e dezembro de 2021”, disse a ONG venezuelana de direitos humanos PROVEA, na 33ª edição de seu Relatório Anual sobre a Situação dos Direitos Humanos na Venezuela. “O alto número de pessoas assassinadas pelas forças de segurança é uma consequência da impunidade estrutural, que incentiva a repetição dos eventos”, indicou a ONG.
“O relatório sobre a violação dos direitos humanos na Venezuela indica que há uma crescente repressão sistemática […] à medida que este [o regime] vai perdendo legitimidade”, disse à Diálogo Luis Fleischman, professor de Sociologia da Universidade Estatal de Palm Beach, na Flórida, e especialista em relações internacionais.
O Centro Gumilla, Centro de Investigação e Ação Social dos Jesuítas na Venezuela, também denunciou, com a PROVEA, os milhares de assassinatos ocorridos em 2021 pelo regime venezuelano. “Pedimos a investigação das supostas execuções extrajudiciais”, afirmou o Padre Alfredo Infante, diretor do Centro Gumilla, em uma entrevista coletiva no dia 19 de maio. “Temos insistido para que seja feita uma investigação para que as famílias das vítimas conheçam a verdade, que haja justiça e reparação, e que o círculo de impunidade seja interrompido”, acrescentou.
O Padre Infante lembrou que, após a publicação de seus relatórios, a PROVEA e o Centro Gumilla foram acusados de difamação pelo estado venezuelano de Carabobo. “Estamos do lado das vítimas e de suas famílias”, disse o Padre Infante em declarações ao site internacional Aleteia. “Não pretendemos nada além de defender o direito à vida e restabelecer o Estado de Direito em nosso país, para que haja verdade, justiça, reparação, para a não repetição, afirmou.
Torturas
Em 2021, a PROVEA também registrou 241 vítimas de torturas – um aumento de 148,4 por cento em relação ao número de vítimas registradas em 2020 –, e o segundo registro mais alto dos últimos 33 anos. “Em 60,9 por cento das queixas de torturas coletadas no presente relatório, as vítimas relataram ter sofrido alguma forma de abuso sexual, que em vários casos incluiu estupro”, ressaltou a PROVEA. O documento revela que houve um aumento nas técnicas de abusos baseadas na humilhação e na redução física e psicológica das vítimas, através de agressões sexuais.
Segundo Fleischman, o alto número de mortos e torturados pelo regime venezuelano “indica que a Venezuela está se tornando incessantemente uma segunda Cuba”, onde o regime se refugia na violência. “Foi assim que o regime de Castro governou por mais de 60 anos e até hoje continua assim”, concluiu.
Em uma decisão histórica, o promotor da Corte Penal Internacional, Karim Khan, anunciou, em 4 de novembro de 2021, sua decisão de abrir uma investigação sobre o possível cometimento de crimes contra a humanidade na Venezuela. “Esta é a primeira decisão dessa natureza a ser proferida no continente e constituiu um passo gigantesco na busca de justiça por parte das vítimas”, disse a PROVEA. Segundo a ONG, as “violações em massa e sistemáticas do direito à vida” evidenciam que as ações dos agentes do regime continuam infringindo as normas nacionais e internacionais sobre o uso diferenciado e progressivo da força.
Direito à justiça
A Venezuela ficou em último lugar entre os 139 países examinados no Índice do Estado de Direito do Projeto Mundial de Justiça de 2021, uma organização internacional sem fins lucrativos, que trabalha para promover o Estado de Direito em todo o mundo. A última edição do índice foi baseada em mais de 138.000 pesquisas domiciliares e 4.200 especialistas para medir como o público em geral experimenta e percebe o Estado de Direito.
O desempenho é avaliado usando 44 indicadores em oito categorias, incluindo Direitos Fundamentais, Ordem e Segurança, Conformidade Regulatória, Justiça Civil e Justiça Criminal. No índice, a Venezuela ficou atrás de países como Afeganistão (134° lugar) e Camboja (138°)