Não é nenhuma surpresa que os países – além do Brasil – que vêm recebendo a maioria dos migrantes que fogem da crise na Venezuela sejam a Colômbia, o Equador e o Panamá. Em 1821, após uma série de efêmeras declarações de soberania que sucederam a diversas batalhas cruéis, a Gran Colômbia, formada pelos países acima, conquistou sua independência da Espanha. Simón Bolívar desempenhou um papel-chave no combate, conquistando para sempre os corações dos venezuelanos. Menos de uma década depois, a Venezuela se separou da Gran Colômbia para tornar-se um país independente. Nos anos 1930, a Venezuela já era um dos principais exportadores mundiais de petróleo, com uma das maiores reservas mundiais de petróleo bruto do planeta.
O país se desenvolveu e se tornou uma democracia relativamente estável e, graças às suas grandes reservas petrolíferas, uma das economias de mais rápido crescimento na América Latina. No entanto, a grande quantidade de petróleo se tornou uma maldição ao invés de uma bênção, e o país agora depende praticamente 100 por cento do petróleo. Em 1983, uma queda dos preços mundiais do petróleo levou o governo a fazer cortes generalizados nos gastos. Tornou-se cada vez mais difícil subsidiar todos os seus produtos, desde o preço da gasolina nos postos aos alimentos nos supermercados, com “petrodólares”.
Fundo Monetário Internacional
O presidente venezuelano na ocasião, Jaime Lusinchi, assinou um pacto entre empresas, sindicatos e o governo para solucionar o impacto, mas nunca conseguiu ter uma presidência tranquila. Seu sucessor, Carlos Andrés Perez, foi eleito em 1989 e não teve outra opção senão fazer empréstimos com o Fundo Monetário Internacional (FMI), na tentativa de revigorar a economia do país.
Historicamente, os fundos do FMI incluem uma série de restrições e têm condições extremamente impopulares, em especial os requisitos para uma ampla redução nos gastos com assistência social. Essa situação causou a queda do presidente Perez e abriu as portas para a ascensão dos líderes populistas de esquerda. Um deles era um jovem oficial militar chamado Hugo Chávez que, em 1992, liderou um golpe fracassado e foi preso, junto com outros militares desiludidos. Apesar do fracasso do golpe, o povo venezuelano, cansado de políticos corruptos e saudosos dos “velhos e bons tempos” dos subsídios baseados em petróleo, admiraram a coragem de Chávez.
Da prisão à presidência
Finalmente, Chávez foi libertado da cadeia e fundou o Movimento da Quinta República. Lançando-se como um agitador esquerdista, ao vender a ideia de empoderar o povo e acabar com a corrupção dos partidos políticos tradicionais que tinham governado a Venezuela durante mais de um quarto de século, Chávez venceu as eleições gerais de 1998 com 56 por cento dos votos, tornando-se o novo presidente.
Chávez iniciou seu mandato com o apoio do povo, quando o preço do barril de petróleo era de mais de US$ 100. A Venezuela era uma nação que nadava tanto nos lucros do petróleo, que o governo esquerdista gastou enormes somas em programas sociais e, num dado momento, chegou a fornecer quase todo o petróleo consumido em Cuba, em troca do apoio do regime de Fidel Castro.
Uma vez no poder, Chávez substituiu o Congresso existente com a criação de uma nova Assembleia Nacional, que ele controlava. Ele utilizou sua nova Assembleia Nacional para reescrever a constituição e se perpetuar no poder, depois de amordaçar a imprensa e também seus opositores para que a lei fosse aprovada. Chávez foi presidente por 14 anos, até sua morte em março de 2013. Entretanto, a sua maior promessa feita ao povo venezuelano de reduzir a pobreza no país nunca se tornou realidade.
Motorista de ônibus
Seu substituto, Nicolás Maduro, foi motorista de ônibus, líder sindical e seguidor incondicional de Chávez, que o indicou à Assembleia Nacional. Como seu sucessor escolhido a dedo, Chávez também nomeou Maduro secretário de Estado, vice-presidente e, por fim, seu herdeiro. Maduro herdou um país em ruínas, que se havia tornado mais dependente do que nunca do petróleo e cada vez mais endividado.
Na medida em que a situação piora na Venezuela, o regime de Maduro prende os líderes políticos oposicionistas, fecha os meios de comunicação e prende jornalistas. Em 2017, a Suprema Corte da Venezuela, formada em sua maioria por apoiadores de Maduro, retirou os poderes da Assembleia Nacional, aumentando seu controle. No ano seguinte, Maduro foi reeleito em um pleito considerado “carente de legitimidade” por uma coalizão de mais de 50 países. Enquanto isso, a situação continua a piorar e cresce a cada dia a pressão do povo venezuelano, que busca pôr um fim na fome e nas lutas diárias.
De acordo com o ACNUR, o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados, e a Organização Internacional para a Migração, que consideraram alarmante o fluxo migratório, o número de fugitivos da Venezuela supera agora os 4 milhões, aproximadamente 12 por cento de toda a população do país.
Em novembro de 2018, a organização Human Rights Watch advertiu sobre a “devastadora crise na saúde” da Venezuela e as crescentes taxas de mortalidade materna e infantil, além do pico dos casos de sarampo, difteria, tuberculose e malária. Susana Mújica, que tem uma doença renal, resumiu a situação crítica da Venezuela em uma entrevista ao jornal britânico The Guardian: “Nós conhecemos a realidade. Para nós, está muito claro porque somos nós que vivemos essa realidade diariamente… Se nós vivemos ou morremos, isso não é importante para eles. Sua prioridade é permanecer no poder.”