O Coletivo sobre Financiamento e Investimentos Chineses, Direitos Humanos e Meio Ambiente (CICDHA), uma ONG que promove os direitos sociais, ambientais, políticos e culturais na América Latina, examinou alguns dos maiores projetos apoiados pela China na América Latina e apresentou algumas conclusões sobre o seu impacto ambiental e quanto aos direitos humanos.
“[A solução] não avança e identificamos novos problemas”, disse à Diálogo Julia Cuadros, membro do conselho diretor da ONG CooperAcción, do Peru, integrante do CICDHA, em 14 de julho. “Um deles é que a política externa da China continua onde as missões diplomáticas, as embaixadas e o próprio governo da China não se comunicam com a sociedade civil.
Entre as conclusões, ela destacou que, dos 26 projetos analisados no final de junho, em pelo menos 24 casos a violação do direito de viver em um ambiente saudável e sem danos ao meio ambiente é repetitiva, 18 casos registram a violação dos direitos coletivos dos povos indígenas, em oito casos a violação dos direitos trabalhistas, e em outros 10 casos a violação dos direitos civis, políticos e econômicos.
Dois projetos
No projeto hidrelétrico equatoriano Coca Codo Sinclair, construído pela empresa chinesa Sinohydro Corporation, o estudo chinês de impacto ambiental não levou em conta a gravidade da erosão regressiva acelerada nos rios provocada pela usina hidrelétrica, causando o desaparecimento da cachoeira San Rafael, de 150 metros, a mais alta do país, em 2 de fevereiro de 2020.
Para mitigar os efeitos da erosão, o Equador e os Estados Unidos assinaram um memorando de entendimento em dezembro de 2021, para proteger as obras de captação de água do Coca Codo Sinclair, que abastece 30 por cento da demanda de energia elétrica para os equatorianos, disse a Corporação Elétrica do Equador.
No Peru, o projeto da Mina Marcona, desenvolvido pela empresa chinesa Shougang Hierro Perú SAA, é um dos mais conflituosos do país, acumulando ações judiciais por violações de direitos trabalhistas. Durante a pandemia, a empresa obrigou os trabalhadores a entrar e permanecer dentro da mina entre 30 e 60 dias, causando 24 mortes de trabalhadores infectados pela COVID-19 e incapazes de sair, afirma o relatório.
O caso da Guiana
“Qualquer aliança com a China […] é muito arriscada”, disse à Diálogo Daniel Pou, diretor do Centro de Análises de Dados de Segurança do Cidadão da República Dominicana. “A China se lançou como um novo colonizador para cooptar pontos estratégicos em seu favor, tais como rotas marítimas, telecomunicações, matérias-primas e toda uma série de elementos fundamentais para seu desenvolvimento, não para o nosso.”
No projeto de US$ 260 milhões da empresa chinesa Raiwail Construction Corporation Limited, para construir uma nova ponte flutuante sobre o rio Demerara, na capital da Guiana, Pou ressaltou que “essa não é uma tecnologia adequada, muito menos para uma ponte com extensão de 2 quilômetros sobre um rio, com custos de manutenção, riscos e insegurança muito elevados”. A ambientalista Simone Mangal-Joly fez uma denúncia ao jornal Guyana News sobre a falta de um estudo de impacto ambiental para o projeto.
Madeira de balsa
O relatório do CICDHA indica que outro grave problema presente em muitos projetos chineses na América Latina é o desmatamento, tanto para a extração de madeira, como para a construção de obras e estradas de acesso a infraestruturas, como a exploração ilegal de madeira de balsa na Amazônia.
“A China […] está implementando campos de energia eólica, e as lâminas de cada módulo são feitas com madeira de balsa, porque pesa pouco. Essa madeira está em nossas florestas amazônicas. A floresta está sendo depredada por empresas chinesas que enviam terceiros para derrubar as árvores”, disse Cuadros. “Eles estão desmatando uma de nossas principais capitais que temos na América Latina.”
A China está fazendo tudo o que pode para ocupar territórios não apenas em infraestrutura, mas também na captura de recursos naturais, disse Pou. “A América Latina se tornou sua despensa para minerais, soja, carnes, peixes, até mesmo para sua transição energética”, enfatizou Cuadros.
Fortalecimento de alianças
A América Latina e o Caribe não podem contar com a China; não há um único projeto chinês que não tenha conflitos, afirmou Cuadros. As pessoas estão sendo diretamente afetadas e, enquanto não mudarem esses comportamentos, suas operações continuarão a ter conflitos.
É necessário “fortalecer alianças com outros continentes, com organizações que estão sofrendo o impacto dos financiamentos e investimentos chineses. Não é só a América Latina”, disse.
Ela também disse que, em outubro de 2023, o CICDHA apresentará o quarto relatório completo sobre o impacto das atividades chinesas na América Latina ao Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas. A terceira foi apresentada em 2018.
“A China tem que olhar para o comportamento de suas empresas públicas, privadas ou mistas, quando atuam […], ou seja, têm que fazer todo o possível para que seus projetos não afetem os direitos civis, políticos, econômicos, sociais, culturais e ambientais”, concluiu Cuadros.