MONTEVIDEO, Uruguai — Autoridades na Argentina, Brasil, Uruguai e Chile estão lutando para conter o crescimento do abuso da pasta-base — uma cocaína barata, amarelada, fumada por milhares de pessoas no cone sul do continente.
Em todos os quatro países, o abuso da pasta-base, também conhecida na Argentina como paco, é bem mais baixo do que o da maconha ou da cocaína. Somente 0,8% dos 3,4 milhões de habitantes do Uruguai usam a pasta-base, de acordo com a Pesquisa Nacional Doméstica sobre o Uso de Drogas, que aponta 4% para cocaína e 12,2% para maconha.
Geralmente, a pasta-base está ligada a criminosos e aos que vivem à margem da sociedade, segundo autoridades. De fato, a proporção de usuários de pasta-base cresceu para 8% nos bairros mais pobres de Montevidéu, de acordo com a mesma pesquisa.
Mílton Romani, um psicólogo de Montevidéu especialista em abuso de substâncias que terminou em abril o seu mandato de seis anos como secretário do Conselho Nacional sobre Drogas do Uruguai, sugeriu que o abuso da pasta-base é “um sinal dos tempos” que primeiro apareceu na Argentina, com a desvalorização da moeda do país em 2001, e se espalhou rapidamente através do Río de la Plata para o Uruguai.
“A crise financeira originou um novo mercado para o tráfico de drogas. A pasta-base é um produto de baixo custo que pode penetrar em um segmento particular do mercado, porque o tráfico de drogas segue as regras do mercado”, disse Romani, um consultor internacional de direitos humanos. “Os traficantes tem que mudar com o tempo. Já que não conseguem mais adquirir grandes quantidades de precursores químicos, têm que olhar para como fazem a cocaína: os grandes laboratórios na Bolívia foram divididos em várias ‘cozinhas’ de drogas na Bolívia e Argentina.”
Na verdade, o dólar forte causou uma disparada no preço da cocaína na região, assim como em 1998 com a decisão de proibir os precursores químicos, que, em 2000, acabou por causar um impacto. Tudo isso fez da pasta-base uma alternativa mais barata e mais rapidamente disponível, segundo autoridades.
Entre 2001 e 2005, de acordo com um estudo do Instituto Transnacional de Amsterdã, o uso de paco na Argentina saltou 200%, com mais de 150.000 jovens usando-o regularmente. Ainda assim, seus usuários representam apenas 0,5% da população da Argentina, disse Mariano Donzelli, da Secretaria de Programação da Drogadição e Luta contra o Narcotráfico (SEDRONAR). Isso se compara à cocaína, que é usada por 2,6% dos argentinos, e à maconha, que é fumada por 6,9% de seus habitantes.
No Chile, a pasta-base é abusada por 0,4% da população, comparado a 0,7% da cocaína e 4,6% da maconha, de acordo com o CONACE (Conselho Nacional para o Controle de Entorpecentes do Chile). Os principais consumidores são homens de 18 a 34 anos e de grupos de baixa renda.
A pasta-base é obtida em uma fase intermediária da transformação da folha da coca em cloridrato de cocaína.
“Quando os precursores químicos são bloqueados nos países produtores, aqueles países começam a enfrentar dificuldades em fabricar o seu produto final, então começam a cortar [a cocaína] com qualquer coisa”, disse o juiz uruguaio Jorge Díaz, que é especialista em crime organizado. “Em vez de exportar a cocaína já purificada da Colômbia, agora eles querem exportar a pasta-base — desde que os níveis de produção continuem altos — e finalizam mais tarde.”
Romani disse que cada ‘cozinha’ é uma pequena peça na rede que exporta cloridrato de cocaína, que continua a gerar o maior comércio para os traficantes de drogas, desde que essa cocaína seja embarcada para a Europa ou para os Estados Unidos.
Muitas variantes da pasta-base existem na região, cada qual com sua própria marca e ingredientes distintos. É um produto muito barato; uma pequena ‘viagem’ custa menos que US$ 3 (R$ 4,5). Os usuários fumam em um cachimbo feito em casa, e uma única dose pesa menos de um grama. A droga leva de cinco a oito segundos para atingir o cérebro, mas o pico não dura mais que 10 minutos.
Ainda assim, tem um efeito devastador no curto prazo, que inclui anorexia, comportamento antissocial e violento, psicoses e alucinações, de acordo com um relatório de 2010 do Instituto de Pesquisas Biológicas Clemente Estable, do Uruguai. “A primeira vez que uma pessoa usa pasta-base, o prazer é muito passageiro”, disse Romani. “Os usuários, então, consomem mais da droga para acalmar sua ansiedade e sentimentos ruins.”
Autoridades dizem que aqueles que moram em bairros pobres ganham a vida traficando pasta-base, geralmente como parte de pequenas redes familiares. “Isso ocorre em setores vulneráveis da sociedade porque os fatores que levaram todos ao microtráfico acontecem lá”, disse Romani. “Essas redes de nível de sustento surgiram no meio da crise.”
O mesmo padrão é encontrado no Brasil, e também está começando a se enraizar na Bolívia.
As organizações criminosas com características específicas são necessárias para coordenar a importação, transporte, exportação e venda da cocaína. O esforço requer um grande investimento inicial. Como, por exemplo, no Uruguai um quilo de cocaína custa de US$ 7.000 a US$ 7.500 (R$ 10.850 a R$ 11.625), de acordo com autoridades locais. Em comparação, a pasta-base custa US$ 2.000 (R$ 3.100) o quilo. Diaz disse que os embarques nunca excedem 30 quilos, e que embarques de 25 a 30 quilos são aventurados apenas por redes de tráficos muito sofisticadas. Carregamentos menores, que constituem a vasta maioria dos embarques, geralmente usam “mulas” ou transportadores humanos.
“Eles descobrem jovens desempregados, geralmente viciados em drogas, pagam-lhes 10.000 pesos (cerca de R$ 850) por viagem. O transportador vai para a Argentina, geralmente Buenos Aires”, disse ele. “Eles até vão e voltam de ônibus, trazendo 10 ou 15 quilos.”
A pasta é entregue em certas áreas de Montevidéu e, de lá, é distribuída para vários bairros na mesma noite, desde que os pontos de venda recebam seus fornecimentos diariamente. As mulas fazem de duas a três viagens por semana, economizando dinheiro e conhecendo os seus revendedores. Depois de um tempo, eles começam a comprar algumas das drogas para si. Eles transportam 10 quilos para cada revendedor que os emprega, e geralmente mantêm um quilo para seu próprio uso.
Nos últimos anos, Diaz disse que o negócio do tráfico se alastrou como fogo, dificultando seu extermínio.
“É muito difícil combater esses traficantes porque transportam quantidades pequenas que se dividem rapidamente. Depois, são muitos grupos pequenos envolvidos no tráfico. Um tipo de indústria caseira que se espalhou nas áreas pobres: as famílias sobrevivem disso.”
Mesmo depois de uma operação, disse ele, a família continuará vendendo drogas, “porque se você processar o marido, a mulher toma conta; se processar a mulher, a mãe dela toma conta.”
O perigo aumenta quando traficantes de pequena escala economizam o suficiente para, depois, exportar e traficar cocaína. Porém, poucos mecanismos ou estruturas existem atualmente para encorajar a cooperação regional na guerra contra a pasta-base.
“Reforçamos as leis sobre os precursores, prevenimos que a cocaína seja exportada [para Europa ou Estados Unidos], temos que combater o cultivo da coca, e ainda nos resta essa porcaria?” disse Romani.
Recentemente a Comissão Interamericana para o Controle do Abuso de Drogas — uma unidade da Organização dos Estados Americanos, com sede em Washington — embarcou em uma iniciativa, lançada pelo Brasil com o apoio dos EUA, para lidar com a expansão da pasta-base.
A plataforma conjunta envolvendo Argentina, Brasil, Chile e Uruguai consiste de uma primeira fase, de cooperação técnica e cientifica para determinar quais substâncias serão atingidas, a segunda, para a coordenação de operações policiais específicas e de interdição, e a terceira, para o tratamento médico.
Ainda assim, o vício por si só não necessariamente conduz ao aumento de crimes violentos, disse Mário Layera, diretor-geral do Departamento de Repressão ao Tráfico de Drogas do Uruguai.
“O que tenho visto em minha área é que, quando os viciados em drogas não têm dinheiro, eles tentam de qualquer maneira conseguir meios para o seu vício. Primeiro eles vendem tudo que têm, depois eles começam a roubar propriedades dos outros para conseguir dinheiro”, disse Layera. “Mas, acho que esses atos são melhor classificados como roubo simples e não como crimes violentos. Resumindo, usar drogas não é o que me faz um assassino ou um ladrão. Na verdade, são outros fatores relacionados às minhas ações ou à minha personalidade que me levou por esse caminho. Acho que a violência é causada por vários fatores e nós devemos estudar todos eles.”
Álcool e drogas respondem por 36% dos crimes cometidos por uruguaios presos, de acordo com um estudo recente feito pelo Conselho Nacional de Drogas do Uruguai. Metade é relacionada com o álcool e a outra metade é relacionada com pasta-base. Isso significa que apenas 18% dos prisioneiros pesquisados atribuíram seus crimes à pasta-base.
Infelizmente, com a pasta-base, o primeiro alvo de violência criado é a própria família do usuário. Alguém que abusa da pasta-base “começa a roubar sua própria família”, disse Romani .
É muito importante conhecer certos assuntos principalmente este assunto sobre drogas em particular a coca, donde ela realmente sai e para onde vai e qual os caminhos que que esses criminosos tomam para chegar ao local desejado, é muito importante que os países do cone sul nunca deixem de combater esse mal !!! Um país só a luta fica difícil e necessário a cooperação de todos os países da América do Sul, sem isso é chover no mlhado !