O projeto de construir um porto multifuncional com o capital de uma empresa chinesa no Rio Grande, Argentina, gerou polêmica por causa do risco de conflitos globais, informou a agência de notícias EFE.
Rio Grande é uma cidade localizada na costa nordeste de Isla Grande de Tierra del Fuego, no Mar Argentino, com acesso direto ao Oceano Atlântico e vias navegáveis até a Antártica.
“Evidentemente, a China está interessada em desenvolver sua estratégia na frota pesqueira no Atlântico Sul, por causa das riquezas do mar, onde a pesca ilegal é crucial e severa”, disse à Diálogo Sergio Cesarín, coordenador do Centro de Estudos Ásia-Pacífico e Índia, da Universidade Nacional de Tres de Febrero, na Argentina, em 5 de fevereiro. “A China também está planejando sua estratégia Antártica, já que tem pelo menos quatro bases no continente branco.”
No entanto, o governo federal negou que sua construção seja viável, asseguraram fontes dos Portos de Vias Navegáveis da Argentina ao portal argentino Infobae.

A controvérsia surgiu depois que se revelou que o governador de Tierra del Fuego, Gustavo Melella, tinha assinado um memorando de entendimento com a empresa estatal chinesa Shaanxi Chemical Industry Group, para instalar um porto no Rio Grande.
“Apesar das idas e vindas de anúncios sobre a construção de um porto e versões de que depois não se concretizaram, não há dúvida de que a presença e a pressão da China no sul da Argentina é um problema muito sério, especialmente com os navios que realizam a pesca ilegal”, afirmou à Diálogo Fabián Calle, analista político e professor de Relações Internacionais da Universidade Austral da Argentina, em 2 de fevereiro.
“Há muito tempo, a navegação da frota chinesa na área do Atlântico Sul vem crescendo exponencialmente”, acrescentou Calle. “Em 2022, 800 barcos de pesca chineses chegaram do Pacífico para pescar ilegalmente.”
Segundo o memorando assinado em 7 de dezembro por Melella, além do terminal portuário multipropósito, a empresa chinesa está empenhada na construção de uma fábrica química com uma capacidade anual de produção de 600.000 toneladas de amônia sintética, 900.000 toneladas de ureia e 100.000 toneladas de glifosato.
Além dessa produção, segundo Infobae, a China está mais interessada em ter seu próprio porto na região mais austral do planeta, que em um futuro próximo poderia ser considerado uma porta de entrada para a Antártica.
“Há um ingrediente constante quando a China financia obras de infraestrutura; as cláusulas dos contratos estabelecem que as contra garantias para o pagamento dessas obras são as próprias obras, e é assim como a China fica com portos e outras infraestruturas, advertiu à Diálogo, em 4 de fevereiro, Luis Somoza, mestre em inteligência e ex-professor de institutos acadêmicos das Forças Armadas da Argentina.
A China opera atualmente quatro bases no território antártico, duas delas permanentes (Base da Grande Muralha e Base Zhongshan) e duas de verão (Base Kunlun e Base Taishan).
“Por mais de 15 anos, os chineses vêm realizando estudos estratégicos para ter uma forte presença na Antártica. Daí o interesse em construir um porto na Tierra del Fuego”, disse Cesarin. “O foco da China no Atlântico Sul, que eles chamam de Oceano Azul, visa o planejamento da pesca, da Antártica e dos corredores bioceânicos.”
Um estudo realizado pela organização de investigação em segurança e defesa dos EUA, Centro para uma Sociedade Livre e Segura (SFS), indicou no último trimestre de 2022 que o número de portos de propriedade ou controle chineses aumentou consideravelmente.
Cerca de 40 portos na América Latina, do Peru ao México, combinados com 11 estações terrestres de satélites na Argentina, Bolívia, Brasil e Venezuela, dão à China uma localização estratégica no Hemisfério Ocidental, ressaltou o SFS.
“Temos que ter em mente que dentro de poucos anos o Tratado Antártico será reestruturado e haverá reivindicações de soberania. Com a China tendo uma porta de entrada para a Antártica a partir deste porto, obviamente dará à China a possibilidade de reivindicar um espaço territorial no continente branco, e isto afetará a segurança do nosso hemisfério”, concluiu Somoza.