Um estudo do Centro para uma Sociedade Livre e Segura (SFS), um think tank de segurança e defesa, sediado nos EUA, indicou no último trimestre de 2022 que o número de portos de propriedade ou controle chinês aumentou consideravelmente.
Aproximadamente 40 portos na América Latina, do Peru até o México, combinados com 11 estações terrestres via satélite na Argentina, Bolívia, Brasil e Venezuela, concedem à China uma localização estratégica no hemisfério ocidental, ressaltou o SFS.
“A China não faz investimentos aleatórios nem escolhe alguma posição geopolítica que não esteja alinhada com seus objetivos estratégicos”, disse à Diálogo Daniel Pou, diretor do Centro de Análise de Dados da Segurança do Cidadão da República Dominicana, em 4 de janeiro.
Muitas das empresas estatais chinesas envolvidas nesses projetos de investimento e desenvolvimento de infraestruturas têm vínculos com o Exército Popular de Libertação da China (EPL), diz o SFS. A força militar da China em apoio à expansão econômica liderada por empresas chinesas vem avançando cautelosamente há muito tempo, indica a plataforma L21 do Uruguai.
As infraestruturas portuárias de Pequim são apenas peças de sua estratégia de expansão econômica, política e militar, a fim de “tornar-se o grande acumulador mundial de matérias-primas, especialmente de recursos latino-americanos”, esclareceu Pou. “A lógica da China não é desenvolver países que estabeleçam alianças com Pequim, mas sim estratégias de longo prazo que facilitem desenvolver sua expansão, pois é uma política expansionista. A América Latina está à mercê do capital chinês.”
Marca de carimbo
Um dos grandes portos que está progredindo é o Terminal Portuário Multipropósito de Chancay, no Peru. O mega terminal está projetado para tornar-se um centro de intercâmbio e distribuição na região, com grandes volumes de mercadorias em trânsito de e para o Pacífico; mas, em essência, é projetado para o envio de matéria-prima da mineração peruana, informou a revista espanhola Cambio 16.
Esta obra, parte da iniciativa Cinturão e Rota, está causando a instabilidade do solo, o colapso das casas, a erosão costeira, o fim da pesca artesanal e danos irreparáveis ao pântano de Santa Rosa, um corredor-chave de biodiversidade na costa central do Peru, relatou a BBC.
Duas empresas chinesas também estão projetando e construindo uma quarta ponte sobre o Canal do Panamá, pelo qual passa 5 por cento do comércio marítimo mundial, indica na internet The Logistics World, um diretório online de recursos logísticos globais. O projeto está em suspenso desde março de 2020 e sua estrutura de financiamento está sendo submetida a uma avaliação pelo governo panamenho.
O EPL busca estabelecer uma base no Panamá, desde que a empresa chinesa Hutchison Whampoa ganhou concessões para operar dois portos lá, em 1999, bem como em El Salvador, desde o anúncio dos planos chineses para um mega-projeto em La Union, relata L21.
A preocupação de que Pequim utilize portos estratégicos para receber navios de guerra chineses aumentou quando a Assembléia Geral do Uruguai aprovou a cooperação de defesa com a China, ressaltou o SFS.
A China leva décadas reforçando sua marinha para proteger seus interesses em todo o mundo. Os portos chineses são de tripla utilização e podem ser usados tanto para o apoio logístico como para recolher informações, bem como opções para futuras bases militares, mostra a plataforma chilena Mundo Marítimo.
“Os investimentos em infraestrutura portuária e aeroportuária [pela China], embora sejam de natureza civil, trazem uma marca de carimbo de hegemonia militar […], estabelecendo limitações às autoridades do país sobre os projetos estratégicos desenvolvidos”, explicou Pou.
Um exemplo disso é o caso de Djibuti, localizado na entrada do Mar Vermelho e do Canal de Suez, um dos pontos de estrangulamento mais transitados do mundo, indica o site financeiro argentino Más Inversiones. Nesse lugar, um porto marítimo se tornou a primeira base militar da China no exterior.
De acordo com a agência de notícias AP, a base naval chinesa no Corno da África está aumentando constantemente sua capacidade. Na base pode haver 2.000 soldados. Eles têm armas, munições e veículos blindados de combate. Os chineses estão ansiosos para colocar suas botas no chão nos portos do Golfo da Guiné e de Angola, explicou.
Também é preocupante o uso crescente de estações terrestres via satélite na América Latina por parte de Pequim, observou o SFS. O avanço do programa espacial da China é uma prioridade para o seu presidente Xi Jinping, que procura fazer de seu país uma potência espacial, relata Reuters.
“A China […] seduz [a América Latina] e vê com bons olhos onde há pouco capital fluindo […], para ter o monopólio de certas rotas marítimas, e isso, por si só, em termos estratégicos militares, representa uma vantagem”, concluiu Pou.