O Ministério de Transportes e Comunicações (MTC) e o Ministério da Habitação, Construção e Saneamento (MVCS) do Peru cancelaram os contratos concedidos às empresas de construção China Tiesiju Civil Engineering Group Co. Ltd., sucursal do Peru (CTCEG), e China Railway Tunnel Group Co. Ltd. (CRTG), filial do Peru, depois de identificar irregularidades nos processos administrativos em que ganharam licitações de infraestruturas públicas no valor total de US$ 240 milhões, informou o jornal peruano La República.
“O modus operandi de algumas empresas chinesas é criar um consórcio com uma pequena empresa nacional, usada para derivar o pagamento de dádivas em favor de ex-funcionários”, disse à Diálogo César Candela, advogado e diretor da Sociedade Nacional de Construção e Infraestrutura do Peru, em 12 de julho. “Durante a pandemia, todas as condições idôneas estavam em vigor para que apenas as empresas com apoio financeiro recebessem [contratos]. Como os bancos nacionais não os apoiavam […], as únicas empresas que tinham [dinheiro] eram as empresas chinesas.”
Os projetos incluíam um contrato de US$ 87 milhões com Provías Nacional, a instituição que administra as rodovias peruanas, que a empresa chinesa CRTG venceu, para melhorar o corredor rodoviário entre Huancavelica e Ayacucho. Outro projeto foi um contrato de US$ 153 milhões para o projeto de água potável e esgoto nas cidades de Piura e Castilla, vencido pela CTCEG, afiliada ao Estado chinês.
“Estamos enfrentando o touro pelos chifres para evitar que empresas de origem duvidosa sejam responsáveis pelas obras. Estamos procurando expor quaisquer falhas durante o processo”, declarou Paola Lazarte, ministra do MTC, à agência de notícias peruana Agencia Peruana de Noticias. “Essa decisão foi tomada com base na auditoria subsequente que o MTC realizou sobre o contrato assinado. Quero reafirmar o compromisso de realizar obras sem irregularidades ou corrupção.”
“Lamentamos profundamente que, apesar de tudo o que aconteceu, continuem as práticas mafiosas, usando ações de proteção legal apresentadas em tribunais remotos, para forçar-nos a assinar o contrato”, disse Hania Pérez de Cuéllar, ministra do MVCS, ao jornal El Peruano. “Continuaremos firmes na defesa da transparência e da probidade na execução de projetos públicos”.
O comportamento identificado pelas autoridades no Peru é que várias empresas chinesas, ligadas entre si como subsidiárias, participam dos mesmos processos de licitação em várias entidades governamentais, “como se fosse um cartel”, acrescenta Pérez de Cuéllar. Esse é o mecanismo que elas usam para garantir contratos.
“Todas as empresas chinesas finalmente acabam sendo irmãs ou primas-irmãs e têm nomes corporativos diferentes. Para esse projeto, a primeira licitante foi a CTCEG, mas sua empresa controladora, a Railway Nº 10 Construction, também participou da licitação. Ela não ganhou, ficou em quarto lugar”, disse Pérez de Cuellar à mídia digital Perú 21. “Haveria uma espécie de concertação ou, de certa forma, um cartel, porque elas concorrem às licitações com nomes corporativos diferentes, mas no final todas acabam respondendo a uma empresa matriz, o que é a mesma coisa.”
De fato, a Lei de Contratações do Estado no Peru e seus respectivos regulamentos não contemplam o esquema usado pelas empresas chinesas para ganhar licitações.
“As filiais, de certa forma, têm autonomia e são um braço da matriz. Mas as empresas chinesas são estatais, porque lá não existe o conceito de empresas privadas. Então, eu questiono como é que uma filial ou várias filiais podem participar, se todos nós sabemos que elas são empresas estatais”, enfatizou Candela. “Mas, como elas são constituídas sob a estrutura da lei como filiais, então várias delas estão vinculadas à mesma matriz.”
“Todas [as empresas] pertencem ao Estado chinês. Sob essa lógica, apenas uma empresa poderia operar”, disse Pablo Rioja, advogado do consórcio do qual a companhia CTCEG participa, a Perú 21. “A lei sobre contratos do Estado não prevê esse grande detalhe”.
Uma comissão especial da Assembleia Legislativa está investigando várias empresas e entidades chinesas acusadas de supostas irregularidades em licitações realizadas por instituições governamentais peruanas.
“A investigação que estamos realizando precisará de mais tempo, sem dúvida, porque descobrimos coisas muito interessantes, como rotas de dinheiro”, explicou ao jornal Correo Héctor Valer, presidente da comissão e membro do partido Somos Perú. “Por exemplo, um alto funcionário do Estado solicitou um empréstimo de um milhão de soles [aproximadamente US$ 281.000], mas o pagou 30 dias depois.”
Uma situação que está sendo questionada é o caso do convite feito pela empresa mexicana de informações DLP Group, especializada no ecossistema digital e que trabalha para empresas chinesas de telecomunicações, como a Huawei. Essa empresa convidou membros do Congresso dos partidos Perú Libre e Acción Popular, para viajar à China com todas as despesas pagas, para “participar de uma feira de tecnologia”, revelou a mídia mexicana NV Noticias. As atividades programadas para os deputados teriam terminado em 2 de julho.
O Código de Ética Parlamentar proíbe que representantes do povo aceitem tais convites. No entanto, a mídia digital Infobae confirmou, em 5 de julho que os deputados ainda não haviam retornado ao Peru e que agora estariam na Holanda.