Para desviar a atenção das ações consideradas como uma ameaça pelos países democráticos, uma das ferramentas que os funcionários russos utilizam em tempos de conflito, além de notícias falsas e desinformação, é o sarcasmo, indicam os meios de comunicação internacionais.
A Rússia usou esse tipo de linguagem quando anexou a Crimeia em 2014, disse Timothy Snyder, professor de história da Universidade de Yale, à emissora de rádio norte-americana NPR, em 22 de fevereiro de 2022.
“Lembro muito bem que o presidente [da Rússia Vladimir] Putin disse naquela ocasião que não havia soldados russos na Ucrânia e, se parecia haver algum, seriam apenas pessoas que tinham comprado roupas usadas de camuflagem em uma loja local”, acrescentou Snyder. No dia 24 de fevereiro de 2022, as tropas russas invadiram a Ucrânia uma vez mais, depois de rejeitar sarcasticamente as especulações de que a invasão era iminente.
O sarcasmo e as piadas mordazes são ferramentas usadas pelos funcionários de Moscou há muito tempo, para menosprezar seus rivais, informou a AP, no dia 16 de fevereiro.
“Estamos diante […] de uma espécie de cinismo pós-moderno, que tenta colocar-nos na defensiva e confundir-nos”, explicou Snyder. “Há duas maneiras de fazê-lo. Pode-se não fazer nada e insistir que está fazendo algo, ou pode-se fazer algo e insistir que não está fazendo nada. Agora mesmo, estão claramente fazendo algo.”
Marca registrada
O tom de deboche “se tornou uma espécie de marca registrada” do Ministério das Relações Exteriores, bem como de outros altos funcionários do Kremlin, informou o site alemão de notícias DW.
Por exemplo, depois que a União Europeia e os Estados Unidos endureceram as sanções contra Putin e a Rússia, no final de fevereiro, como a proibição de viajar a vários países, a porta-voz do Ministério das Relações Exteriores russo, Maria Zakharova, disse que “as sanções contra o presidente e o ministro das Relações Exteriores [Sergey Lavrov] são um exemplo e uma demonstração da total impotência dos países ocidentais”.
Em fevereiro, a Rússia também tentou ridicularizar os meios de comunicações norte-americanos por terem prenunciado para o dia 16 de fevereiro (uma quarta-feira) a invasão russa à Ucrânia: “Avisem-me quando será a próxima invasão à Ucrânia, para eu poder planejar minhas férias”, declarou Zakharova, de acordo com a ABC Internacional. “Espero que a mídia publique o calendário de nossas próximas invasões este ano.”
O embaixador russo na União Europeia, Vladimir Chizhov, também ridicularizou o presidente dos EUA, Joe Biden, por prever que a guerra poderia começar já nessa quarta-feira. “As guerras na Europa raramente começam em uma quarta-feira”, disse Chizhov, informou a ABC News.
Por sua vez, Lavrov disse que sua conversa (no dia 10 de fevereiro) com sua homóloga britânica Liz Truss parecia uma conversa entre surdos e mudos, informou a Reuters.
Truss respondeu que continuará insistindo com a Rússia sobre seu comportamento agressivo. “Preocupa-nos um governo com intenções expansionistas, que busca derrubar as democracias em sua fronteira […]. Francamente, os insultos de Sergey Lavrov não me afetam”, disse.
Snyder explicou à NPR a grande diferença entre o sarcasmo que o governo russo usa, em contraste com o tipo de linguagem dos diplomatas do ocidente democrático.
“Os diplomatas do ocidente são geralmente sérios […]. Quando enfrentam os russos, fazem todo o possível para serem realistas e cuidadosos com a maneira como falam, porque querem evitar a armadilha de estarem envolvidos em algum tipo de concurso de comédia ou algum tipo de concurso de sarcasmo”, concluiu.