Um relatório divulgado em 29 de fevereiro pela organização Freedom House apresenta Nicarágua e Venezuela no topo de sua lista negra de países por região, onde a manipulação eleitoral foi utilizada, levando a um declínio significativo de direitos políticos e liberdades civis nos últimos 10 anos.
“A liberdade global deu um grande passo para trás em 2023”, ressaltou Michael J. Abramowitz, presidente da Freedom House. “O mundo enfrenta outro teste crucial em 2024, quando bilhões de pessoas vão às urnas e vários conflitos armados (incluindo os de Sahel, Europa Oriental, Cáucaso do Sul e Oriente Médio) continuam a violar os direitos básicos das pessoas.”
O relatório intitulado Liberdade no mundo, 2024: Os danos crescentes de eleições deficientes e conflitos armados aponta a Nicarágua como um país onde as “condições de direitos políticos e liberdades civis” diminuíram, para continuar sendo um país onde não há liberdade, seguido pela Venezuela.
Freedom House observa que “declínios dramáticos na liberdade” foram observados em todas as regiões do mundo.
O relatório destaca que a manipulação eleitoral foi um dos principais fatores da deterioração dos direitos e das liberdades.
Nicarágua, “não livre”
No período entre 2013 e 2023, a Nicarágua passou a ter uma pontuação de -38 pontos, a mais baixa do mundo, à frente de nações como Azerbaijão, Líbia e Tanzânia.
A Nicarágua está passando por uma crise sociopolítica desde 2018, quando protestos contra Daniel Ortega irromperam e foram reprimidos, deixando mais de 300 pessoas mortas e milhares exiladas, de acordo com organizações de direitos humanos.
A Freedom House, uma organização não governamental com sede em Washington, disse que um “método comum de manipulação pré-eleitoral” também é comum na nação centro-americana, que consiste em “mudar as regras eleitorais de forma a ajudar os titulares a competir, ou simplesmente permitir que eles concorram, apesar dos limites constitucionais de mandato”.
Na Nicarágua, Ortega apelou em 2009 à Suprema Corte de Justiça para solicitar que um artigo constitucional que proibia a reeleição fosse declarado inaplicável. O líder sandinista havia retornado ao poder em 2007, após várias tentativas fracassadas.
A Câmara Constitucional da Nicarágua emitiu uma resolução favorável ao recurso. Desde então, Ortega permaneceu no poder por mais de 15 anos consecutivos e conseguiu reformar a Carta Magna para se reeleger indefinidamente.
Em fevereiro de 2023, os Estados Unidos mediaram com o regime de Ortega a libertação de 222 prisioneiros políticos, que foram recebidos em Washington sob liberdade condicional humanitária. Mas o regime de Manágua continuou seu ataque contra padres católicos e religiosos de diferentes ordens no país.
Desde 2018 até o momento, pelo menos 18 religiosos, incluindo dois bispos e três seminaristas, foram privados de sua liberdade. Os Estados Unidos condicionaram o levantamento das sanções contra Manágua a um compromisso com maiores liberdades no país.
Em 2024, espera-se que mais de 75 países realizem cerca de 80 processos eleitorais, o que faz com que seja considerado um ano eminentemente eleitoral, que pode não acontecer novamente por pelo menos duas décadas. Essas eleições mundiais podem atingir mais de 4,2 bilhões de pessoas.
Venezuela: “mudança de regras”
O relatório da Freedom House indica que a liberdade em nível global diminuiu pelo 18º ano consecutivo. Nessa ordem, a Venezuela é um dos países em que “que a manipulação das eleições esteve entre as principais causas da erosão global da liberdade”, afirma o relatório.
O venezuelano Nicolás Maduro foi destacado entre aqueles que “mudaram as regras” para reivindicar suas respectivas vitórias em “disputas planejadas”.
Em uma escala negativa de 0 a -40, a Venezuela caiu para o oitavo lugar, com -23, antecedida por nações com marcada falta de liberdade, como Burkina Faso e Sudão, para citar dois exemplos.
“As forças de oposição organizaram uma primária independente para encontrar um candidato de unidade que se enfrentará ao governante autoritário Nicolás Maduro, no poder desde 2013. A Suprema Corte não só proibiu a vencedora, María Corina Machado, de participar da eleição, mas um tribunal também ordenou a suspensão de todo o processo primário, do qual 2,4 milhões de pessoas haviam participado, e as autoridades ameaçaram os organizadores com processos criminais”, indica Freedom House, para exemplificar o caso venezuelano.
Os Estados Unidos ameaçaram reverter a flexibilização do regime de sanções econômicas contra Caracas após a proibição da opositora Machado e a subsequente prisão de vários ativistas políticos.
Na última semana de fevereiro, o regime de Maduro e os partidos de oposição na Venezuela retomaram suas negociações públicas em meio a um clima de desconfiança entre as partes e com pouco progresso – de acordo com especialistas – nos acordos políticos assinados há quatro meses.
O relatório também aponta a “negação dos direitos políticos e das liberdades civis em territórios disputados”, como um obstáculo às democracias.
Em dezembro de 2023, Maduro reavivou a reivindicação da Venezuela sobre Essequibo, essa região da Guiana rica em petróleo, e então “funcionários responsáveis pela imposição da lei ordenaram a prisão de vários políticos que supostamente se opuseram a seus esforços”, critica Freedom House.
“Uma proliferação de apropriações autoritárias de terras tem o potencial de esmagar as liberdades de ainda mais pessoas nos próximos anos”, conclui a organização em sua análise sobre a Venezuela e outros países, como é o caso da China com o território de Taiwan.