No dia em que a fachada da sua modesta casa amanheceu coberta por grafite com os dizeres “vamos X você”, com a assinatura dos “coletivos” (gangues armadas que apoiam o regime de Nicolás Maduro), Milagros Eulate, deputada pelo estado de Vargas, no litoral central da Venezuela, disse à Diálogo: “Isso vai se agravar.”
“Isso” é o assédio que Maduro mantém, por todas as vias de que dispõe, contra os deputados oposicionistas que, como Eulate, controlam uma enorme maioria de mais de dois terços da Assembleia Nacional da Venezuela.
Lamentavelmente, Eulate tinha razão: no dia 14 de maio, a Guarda Nacional da Venezuela impediu o acesso dos deputados, funcionários administrativos e até mesmo da imprensa ao prédio em Caracas onde funciona a Assembleia Nacional, único poder constituído reconhecido tanto pela comunidade internacional quanto pela oposição local. A desculpa oficial foi uma ameaça de bomba que apenas as autoridades pró-Maduro supostamente teriam recebido, e que não chegou a nenhum membro da oposição. Esta não foi a primeira vez que uma “ameaça de bomba” tinha sido relatada.
A Organização dos Estados Americanos condenou os ataques contra os parlamentares no dia 13 de maio. No entanto, esses ataques não pararam; ao contrário, aumentaram em frequência e intensidade, como se viu no dia 14 de maio.
Ter o exterior de sua casa grafitado não é o pior que um deputado pode esperar do regime: três parlamentares continuam presos, com sua imunidade parlamentar violada, como é o caso de Édgar Zambrano, Juan Requesens ou Gilber Caro. Alguns recorreram ao exílio, como Julio Borges ou Carlos Vecchio, e outros procuraram refúgio em embaixadas de nações parceiras, sem ter podido sair de Caracas. Ao todo, 25 por cento dos deputados estão presos, no exílio, ou foram perseguidos e privados de sua imunidade parlamentar por um regime que a cada dia dá um passo novo e audaz para dissolver a Assembleia Nacional.
Quase todos os deputados tiveram as portas de suas casas grafitadas, sofreram ameaças pelas redes sociais ou até mesmo pela televisão estatal, antes de serem presos ou exilados.
No dia 13 de maio, o Serviço Bolivariano de Inteligência Nacional (SEBIN) tentou prender Alfredo Ramos, outro deputado opositor e ex-sindicalista, no estado de Lara, na região ocidental. Os vizinhos impediram o ato, mas nem todos os deputados têm tanta sorte quanto Ramos.
Do lado de fora de seu apartamento em Vargas, Eulate não parece ser uma ameaça para um regime violento. Seu marido não fala, mas está preocupado: todas as visitas passam por ele. As precauções são básicas, porém efetivas. O marido da deputada aguarda os veículos dos jornalistas em uma rua próxima, com o telefone na mão, antes de conduzi-los ao local onde se encontra a deputada.
“Sem dúvida alguma, é um plano orquestrado a nível nacional por parte de um governo que já está falido, de narcotraficantes e criminosos”, disse Eulate, parada em frente à porta de sua casa. “Esse é um plano de psicoterror, no estilo nazista. Eu não tenho medo em absoluto; o que causa medo é a fome e a falta de remédios. Continuaremos protestando nas ruas”, disse, olhando de vez em quando para o grafite.
Os atacantes “chegaram encapuzados, em um carro preto, por volta das 3 horas da madrugada, e eram quatro pessoas. Essa não foi a primeira vez”, disse Eulate sobre o último ataque. Ela afirma ter feito todas as denúncias às autoridades competentes, inclusive às agências policiais que ainda obedecem a Maduro.
No entanto, como já ficou demonstrado, esse não foi tampouco o último ataque contra a oposição. O regime “é como um animal ferido. Este governo está ferido e tenta sobreviver a qualquer custo”, afirmou Eulate.