O Parlamento da Nicarágua aprovou, no dia 21 de dezembro de 2020, uma lei que abre caminho para que Daniel Ortega se mantenha no poder nas próximas eleições de novembro de 2021.
A Lei de defesa dos direitos do povo à independência, à soberania e à autodeterminação para a paz permitirá ao regime sandinista declarar qualquer opositor como “traidor da pátria” e, com essa classificação, impedir que ele se candidate a cargos de eleição popular.
“A iniciativa aprovada pela Assembleia Legislativa pretende restringir os direitos políticos com o objetivo de limitar a concorrência eleitoral”, disse à imprensa Luis Almagro, secretário-geral da Organização dos Estados Americanos (OEA), no dia 21 de dezembro de 2020. “O governo da Nicarágua […] negará ao povo nicaraguense o direito de eleger livremente seus representantes, transformando a votação em uma imposição, ao invés de uma eleição.”
“A iniciativa aprovada pela Assembleia Legislativa pretende restringir os direitos políticos com o objetivo de limitar a concorrência eleitoral”, Luis Almagro, secretário-geral da Organização dos Estados Americanos.
Gabriel Álvarez, advogado nicaraguense especialista em direito constitucional, explicou ao portal Despacho 595 que a nova lei contraria a Constituição do país centro-americano e afeta diretamente o processo democrático vindouro.
“Do ponto de vista estritamente técnico-jurídico, trata-se de uma lei deplorável, e do ponto de vista político ela também o é, porque se fecham as opções para uma saída pacífica, institucional, que é o que deseja o povo nicaraguense”, disse Álvarez.
O texto aprovado permite que Ortega aplique sanções contra seus detratores arbitrariamente, pois não inclui qualquer garantia no processo de declarar alguém “traidor da pátria”; entre essas sanções, não está apenas a impossibilidade de concorrer a cargos de eleição popular, mas também inclui penas de detenção.
“Se a Nicarágua der cabimento a uma lei como a que Daniel Ortega ordenou que fosse aprovada, em primeiro lugar essa lei teria que ser aplicada a ele. Por todas as violações que cometeu e os danos que provocou, ele deveria ser o primeiro impedido de concorrer a um cargo público”, publicou em seu portal Juan Sebastián Chamorro, membro da ONG oposicionista Aliança Cívica, e um dos críticos permanentemente vigiados pela polícia.
A lei foi aprovada com 70 votos dos sandinistas e seus aliados, contra 14 votos contrários e cinco abstenções. A nova legislação se soma a outras manobras realizadas pelo regime para garantir que não sejam realizadas eleições livres e transparentes no mês de novembro.
“A estratégia de Ortega pretende utilizar as leis para limitar qualquer tipo de concorrência; depois aumentará a repressão, acompanhada de benefícios clientelistas para, no final do processo, empenhar-se a fundo com todos os meios para obter uma vitória sem dificuldades”, disse à agência AFP Manuel Orozco, diretor do Centro para a Migração e Estabilização Econômica, com sede em Washington.
Repressão constante
Em outubro de 2020, a Secretaria Geral da OEA denunciou que o regime de Daniel Ortega mantém pelo menos 113 presos políticos. “Todos foram publicamente apresentados como criminosos e não tiveram acesso a um processo judicial justo, sendo assim violentados o princípio de presunção de inocência e todas as suas liberdades fundamentais”, acrescentou a OEA.
Ortega está no poder desde 2007. Durante sua ditadura foram registradas diversas violações aos direitos humanos, o que aumentou a partir de abril de 2018, quando surgiu uma série de manifestações contra o regime.
A ONG Associação Nicaraguense Pró Direitos Humanos, com base temporária na Costa Rica, informa que entre abril de 2018 e janeiro de 2019 o país registrou 651 mortos e 4.578 feridos vítimas da repressão do regime de Ortega. A organização informa ainda que 1.336 pessoas desapareceram nas mãos de grupos paramilitares.