A Operação Chavín de Huántar foi considerada uma das operações militares de resgate mais bem-sucedidas nos tempos modernos. Foi uma operação do governo do Peru realizada em abril de 1997 para resgatar 72 reféns do grupo terrorista residual Movimento Revolucionário Túpac Amaru (MRTA), durante uma crise na residência do embaixador japonês no país andino. A operação foi um sucesso, graças à participação das forças especiais do Exército do Peru.
Para saber mais sobre a evolução da preparação das forças peruanas e analisar outros temas relevantes, Diálogo conversou com o General de Brigada do Exército do Peru Hugo Antonio Molina Carazas, comandante da 1ª Brigada de Forças Especiais.
Diálogo: Houve mudanças no treinamento das forças especiais do Peru depois da Operação Chavín de Huántar?
General de Brigada do Exército do Peru Hugo Antonio Molina Carazas, comandante da 1ª Brigada de Forças Especiais: Para nós, como integrantes das forças especiais do Exército do Peru, a operação militar Chavín de Huántar foi realmente um dos fatos históricos mais importantes que envolveram as nossas Forças Armadas, porque foi um trabalho planejado, que teve a participação da nossa Marinha de Guerra, que contou também com as suas forças especiais. O sucesso obtido foi produto desse planejamento conjunto que fazia parte das capacidades que as nossas forças especiais já tinham. Isso ocorreu porque através dos anos as nossas forças especiais sempre estão em constante treinamento, devido à situação que se vivia [no país] na década de 1990 e, muito antes, na década de 1980. Nós enfrentávamos uma ameaça que causou muitos prejuízos ao país, que é o terrorismo, com a organização terrorista Sendero Luminoso e o Movimento Revolucionário Túpac Amaru. Isto fez com que as nossas forças se mantivessem em constante treinamento e adquirissem as capacidades que puderam demonstrar na operação militar Chavín de Huántar, uma operação difícil. Todos nós sabemos que o resgate de reféns não é uma operação fácil; eu me sinto orgulhoso, tanto quanto meus companheiros que participaram dessa operação, por termos atingido esses bons resultados.
Diálogo: A Chavín de Huántar foi uma operação bem-sucedida, mas a ameaça do terrorismo no Peru não terminou ali. É certo que o MRTA desapareceu, mas o terrorismo do Sendero Luminoso continuou através dos anos…
Gen Bda Molina: Foram capturados os principais chefes, mas o terrorismo deixou uma sequela que ainda existe na zona rural e que representa uma ameaça. No entanto, é certo que se trata de uma organização já enfraquecida. Inclusive, eu acredito que eles já não têm a ideologia clara daquilo que o Sendero Luminoso representava nas décadas de 1980 e 1990. Ainda existe no pensamento das pessoas a ideia de que em uma zona do VRAEM [Vale dos rios Apurímac, Ene e Mantaro] eles se aproveitam das condições meteorológicas de uma região agreste e ainda mantêm uma certa presença. Isto, sem dúvida, é considerado uma ameaça ao setor, à região geográfica onde eles vivem atualmente. Essa presença está vinculada a um inimigo que sempre esteve também nessa zona: o narcotráfico. As duas ameaças, o terrorismo e o narcotráfico, também são fatores que dão origem a outras ameaças, como o tráfico de pessoas. Entretanto, respondendo à primeira pergunta, depois do que ocorreu com as experiências das décadas de 1980 e 1990, e não apenas com a Chavín de Huántar, nossas Forças Armadas melhoraram ou implementaram o planejamento estratégico, mas já com uma visão diferente, onde a interoperacionalidade das três forças [Exército, Marinha e Força Aérea] precisava ser evidente. Isso tornou possível a criação do Comando de Inteligência e Operações Especiais Conjuntas (CIOEC), que está sob a direção do Comando Conjunto e é a cabeça do sistema de forças especiais das nossas Forças Armadas.
Diálogo: Quais foram as principais mudanças ocorridas depois da criação do CIOEC?
Gen Bda Molina: A nossa participação como brigada de forças especiais era mais direta porque éramos subordinados ao chefe do Comando Conjunto e atuávamos com nossos batalhões, o 19º Batalhão de Comando e o 61º Batalhão de Comando. Mas, depois da criação do CIOEC, estabeleceu-se uma tradição do emprego das forças especiais. Já existem unidades constituídas pela Marinha, pela famosa Força Especial Conjunta do Exército, com algumas patrulhas, e também pela Força Aérea.
Diálogo: Como vocês contribuem para essa estrutura?
Gen Bda Molina: Atualmente, temos seis patrulhas do 61º Batalhão de Comando, que fazem parte da Força Bravo do CIOEC, e temos quatro patrulhas do 19º Batalhão de Comando, que agora operam na zona do VRAEM, parte do componente de forças especiais. Mas aqui a particularidade é que eu não tenho mais o comando como o comandante da força. Eu os treino, eles são equipados com base na estrutura que nós temos e os entregamos, nesse caso, à liderança do sistema de forças especiais, que é o CIOEC. São eles que têm atualmente o comando direto das patrulhas que saem daqui, da brigada na base, em apoio ao CIOEC.
Diálogo: Quais são os treinamentos realizados com os Estados Unidos?
Gen Bda Molina: Existe uma grande coordenação por parte do CIOEC com o grupo consultivo. Às vezes, nossos comandantes mantêm contato direto com eles. Faz-se uma coordenação com membros do Comando Sul [dos EUA] e normalmente eles vêm nos treinar ou capacitar em tarefas pontuais, como, por exemplo, planejamento ou operações puramente táticas ou operacionais, para as quais eles fornecem todos os instrutores. Frequentemente, inclusive, eles trazem também os recursos, pois nós não temos a verba que gostaríamos de ter para capacitar a força. Nesse sentido, os Estados Unidos nos dão um grande apoio, tanto às patrulhas que pertencem à Força Bravo quanto às patrulhas do 19º Batalhão de Comando.
Diálogo: Quais são os treinamentos realizados com os demais países da região?
Gen Bda Molina: Eu diria que não se trata de um treinamento como [o que realizamos] com os Estados Unidos. Nós enviamos oficiais dos primeiros postos do programa regular de comandos; os dois melhores vão para a Colômbia e fazem parte do Curso de Lanceiros. Então eles voltam com essa experiência e são instrutores da Escola de Comando. Eu creio que agora temos tido, nesse âmbito, uma participação maior com a Colômbia ou o Brasil em algumas unidades de fronteira, porque não pertencem necessariamente às forças especiais. Mantemos reuniões bilaterais, onde chegamos a um acordo sobre a necessidade de uma força ou de uma unidade, não necessariamente de unidades, mas que participem de uma abordagem conjunta, como por exemplo, que estejam na fronteira com a Colômbia. As unidades estão nas fronteiras com os seus Estados-Maiores para participar de um planejamento para integrar as capacidades e ver como se opera. Em algum momento, elas podem realizar algumas operações, mas não somos necessariamente partícipes como forças especiais.
Diálogo: O senhor tem quase 30 anos de carreira militar. Qual foi a principal lição aprendida em todos esses anos?
Gen Bda Molina: Creio que se deve comandar com o exemplo. Por ser general, eu tenho meus anos de carreira, mas sempre comando com o exemplo, ou seja, fazendo as coisas para que elas sejam cumpridas, mas devemos ser os primeiros a cumpri-las. A idade não passa em vão e já não temos a capacidade física de um rapaz de 20, 25 [anos]. Entretanto, quanto ao espírito, eu continuo sendo o mesmo. E isso é o mais importante.
Diálogo: O senhor gostaria de acrescentar alguma coisa aos leitores da Diálogo?
Gen Bda Molina: Eu penso que um país sem segurança, sem a tranquilidade dos seus cidadãos e da sua população, suscite muita desconfiança, muito mal-estar. Como integrantes das forças especiais, nos estimula esse espírito de convicção da nossa profissão e a missão que devemos cumprir em algum momento e em qualquer cenário. Nosso pessoal estará onde estiverem as ameaças. Eles serão capazes de operar e cumprir essa missão e dar, sobretudo à nossa população, à nossa sociedade, a tranquilidade de que o cidadão necessita para realizar as suas atividades. Eu creio que esse seja um desafio pessoal e profissional para que nossos cidadãos, nossa população, fiquem tranquilos, para que tenham a segurança de que as suas Forças Armadas: Exército, Marinha, Força Aérea e, sobretudo, as forças especiais, sempre estarão preparadas para entrar em ação quando a nação precisar.