‘A Guerra Fria terminou, mas o pensamento da Guerra Fria sobrevive’
Sir Joseph Rotblat, físico polonês
Em 1955, em meio à Guerra Fria, a Força Aérea dos EUA idealizou um conceito de projeto de arma nuclear envolvendo um míssil supersônico nuclear de voo baixo que transportava uma ogiva termonuclear. O Míssil Supersônico de Voo Baixo, abreviado como SLAM (em inglês), estava décadas à frente de quaisquer outros do gênero. Ele utilizava um radar de encaixe embutido para contornar o terreno que o direcionava para o alvo pretendido em velocidade supersônica. O sistema de propulsão foi projetado para injetar ar através de uma abertura dorsal, esquentar e comprimir o ar com um reator nuclear, propulsioná-lo através do exaustor e impulsionar o míssil. Um tipo experimental de cerâmica foi criado para suportar o calor intenso e o peso que o SLAM demandava, permitindo que a arma atingisse um raio de 113.000 milhas, quase quatro vezes e meia a circunferência da Terra. Esse conceito inovador foi eliminado em 1964 porque o desenvolvimento dos mísseis balísticos estava encerrado, e os EUA não poderiam garantir a segurança de testar um reator que pudesse dispersar quantias substanciais de emissões radioativas.
Em 2018, a Rússia revelou o protótipo de um motor nuclear baseado na mesma tecnologia usada no projeto SLAM. Esse modelo aperfeiçoado, o 9M730 Burevestnik, apelidado de SSC-X-9 ou Skyfall pela OTAN, foi projetado para ser o principal avanço nuclear. O míssil Skyfall foi criado com a capacidade de voar em uma velocidade impressionante utilizando um reator nuclear para propelir ar comprimido. Teoricamente, o míssil seria hipersônico com alcance virtualmente ilimitado. Diferentemente de um Míssil Balístico Intercontinental tradicional, que é lançado em uma plataforma de voo geralmente transparente à estratosfera, de onde descerá para seu alvo, o Skyfall voará a baixas altitudes, escapando do rastreamento de radares. Além disso, essa arma de terror pode atacar de surpresa quando totalmente desenvolvida e destacada. Até agora a Rússia não tem sido bem-sucedida nesses esforços.
Nos últimos 10 anos a Rússia investiu US$ 150 bilhões em pesquisas e desenvolvimento de armas nucleares. Ainda que tenham tido algum sucesso, eles também fracassaram. O maior fracasso dos testes ocorreu em agosto de 2019, quando o míssil explodiu durante um teste em Nenoska, Rússia, matando cinco cientistas e dois militares. Apesar da explosão e da perda de vidas ter sido horrível, o fracasso da explosão aumentou os níveis de radiação na área circundante em quase 200 vezes o nível normal. Essa informação foi oculta da população local por muitos dias enquanto a radiação poderia ter deixado as pessoas potencialmente doentes ou com efeitos de longo prazo. Quando a informação foi, por fim, liberada ao público, a divulgação da notícia durou 36 segundos; isso mostra como as lideranças russas valorizam a vida humana em comparação aos testes militares. Durante a cerimônia em homenagem aos homens mortos na explosão, o presidente russo Vladimir Putin disse que “… a arma deve ser aperfeiçoada apesar de tudo”. Ele pretende sacrificar mais vidas, caso seja necessário, para ameaçar o mundo com sua arma.
Se o projeto russo for adiante, haverá risco de mais vidas perdidas de cientistas e desenvolvedores que trabalham no míssil. Eles também apostam que a arma não explodirá novamente, enviando quantidades enormes de radiação às cidades próximas, ou até mesmo aos países vizinhos. Se o míssil não conseguir decolar, ele esguichará radiação por onde sobrevoar, irradiando potencialmente pessoas inocentes, animais e ecossistemas inteiros. Até mesmo um teste “bem-sucedido” trará consequências ruins para o mundo. Um míssil que voa indefinidamente é um risco constante para as viagens aéreas internacionais, e o impacto de um fracasso do voo, exaustão nuclear e outros resultados não previstos não podem ser desconsiderados.
O mundo já sofreu muitos acidentes nucleares no desenvolvimento e no teste do sistema Skyfall, o que só mostra a não disposição para aprender. Más ideias não se aperfeiçoam com o tempo, e a comunidade internacional deve condenar essa aventura irresponsável antes que seja tarde demais!