A Rússia, assim como a China, ganhou acesso às reservas de lítio da Bolívia, estimadas em 23 milhões de toneladas, e consideradas as jazidas de lítio mais ricas conhecidas do mundo. No entanto, a aparente preferência da Bolívia por China e Rússia preocupa especialistas, devido aos baixos padrões e regulamentações ambientais de ambos os países para suas empresas e riscos de corrupção e ineficiência, entre outras questões.
O governo boliviano já assinou acordos com o consórcio chinês CATL BRUNP & CMOC (CBC) e a empresa Citic Guoan Group. Em meados de dezembro, a Bolívia também assinou um acordo de US$ 450 milhões com a estatal russa Uranium One Group, subsidiária da Rosatom, proporcionando à Rússia acesso às suas reservas.
Sob o acordo, a empresa russa investirá na Bolívia durante dois anos em um projeto-piloto de produção de lítio na comunidade de Colcha K, no departamento de Potosi, em três fases. Na primeira fase, a meta é produzir 1.000 toneladas de carbonato de lítio por ano, na segunda fase até 8.000 toneladas e mais 5.000 toneladas na terceira fase. O contrato é o segundo assinado com a Uranium One Group. No primeiro, em junho de 2023, as partes contratantes concordaram em construir um complexo industrial de carbonato de lítio em Pastos Grandes, no sudoeste da Bolívia.
À medida que a Rússia assume um papel fundamental na extração de lítio na Bolívia, especialistas se preocupam com um possível desastre ambiental. “Onde a Rússia lidou com recursos energéticos, incidentes ambientais têm sido comuns”, escreveu Joseph Bouchard, analista canadense com foco em geopolítica e segurança na América Latina, em um artigo de opinião para o site de notícias ambientais Mongabay.
Já com a China, o primeiro acordo foi feito em janeiro de 2023 com o consórcio CBC, sob a liderança do CATL, para investir um total de US$ 1,4 bilhão na instalação de duas plantas industriais de extração direta de lítio no Salar de Uyuni, maior deserto de sal do mundo. Em junho de 2023, a Bolívia assinou um contracto com Citic Guoan, para ter direito a explorar reservas de lítio também na Salar de Uyuni. Mais recentemente, em 18 de janeiro de 2024, o consórcio CBC firmou outro acordo aprofundando sua cooperação na exploração do lítio no Salar de Uyuni, com um investimento adicional de US$ 90 milhões.
Entre as preocupações quanto ao CATL, está seu vínculo com o trabalho forçado uigur, relatou Diplomat. “Uma grande parte das instalações de processamento e fabricação de produtos de lítio da China está localizada na Região Autônoma Uigur de Xinjiang, onde a China tem sido acusada com credibilidade de internação em massa e trabalho forçado de uigures e outros grupos minoritários”, informou Diplomat. “Setores como mineração, agricultura e manufatura são contaminados pelo trabalho forçado uigur, que é então vinculado às cadeias de suprimentos globais.”
A professora Stella Christina Schrijnemaekers, coordenadora dos cursos de Relações Internacionais, Comércio Exterior e Logística, do Centro Universitário das Faculdades Metropolitanas Unidas, acredita que é vital para a defesa do país a preocupação com os efeitos socioambientais negativos em relação aos países vencedores das licitações. As duas potências que saíram na frente têm histórico de violações de direitos humanos e trabalhistas, bem como de desrespeito ao meio ambiente.
“Todos os países devem ficar atentos às questões de direitos humanos e trabalhistas em seu próprio país, independentemente da atuação das empresas, sejam elas nacionais ou multinacionais. Infelizmente, violações de leis e direitos humanos, assim como mau uso de recursos naturais, não são uma prerrogativa da Rússia ou da China”, declarou à Diálogo a professora Schrijnemaekers. “Caberá à Bolívia ficar atenta”, concluiu a professora.