Quase 24 por cento da produção mundial de cocaína passa pela Venezuela, informa o relatório Avaliação Nacional da Ameaça das Drogas 2020, da Administração para o Controle de Drogas dos EUA (DEA, em inglês). O documento, publicado no dia 2 de março de 2021, confirma a importância do país sul-americano como ponto de passagem para a droga enviada para os Estados Unidos.
Segundo o relatório, durante a pandemia da COVID-19, os narcotraficantes optaram sobretudo pelo uso de lanchas rápidas, com destino ao denominado “vetor do Caribe Ocidental”, que inclui Honduras, Belize e Nicarágua e, em menor escala, à República Dominicana, Haiti e Porto Rico.
As organizações criminosas colombianas, segundo o relatório da DEA, “continuam usando o Equador e a Venezuela como pontos de transbordo para os embarques de cocaína para o México, a América Central e o Caribe”. Em ambos os casos, a droga é escondida em lugares remotos “até que o transporte aéreo ou marítimo esteja garantido”.
No dia 7 de março, o jornal El Vocero, de Porto Rico, reportou a apreensão de 1,6 tonelada de cocaína na praia El Cocal, na região leste da ilha. O contrabando, distribuído em 80 pacotes, foi transportado até essa localidade por dois dominicanos que, segundo a notícia, haviam partido da Venezuela em uma lancha.
Da mesma forma, no dia 8 de março, o canal de notícias EVTV, com sede em Miami, informou que as autoridades hondurenhas haviam detido quatro venezuelanos que transportavam 700 quilos de cocaína em uma lancha, perto da Ilha de Cayo Gorda, no Caribe hondurenho.
O ex-chefe do Comando Antidrogas da Guarda Nacional Bolivariana, o Coronel (R) Jairo Coronel, consultor para temas de segurança, destacou que devido à pandemia e às operações de interdição, grande parte da cocaína produzida não chegou aos mercados finais. No dia 1º de abril de 2020, o Comando Sul dos EUA iniciou operações antinarcóticos no hemisfério ocidental, tendo como principal objetivo da interdição o fluxo de entorpecentes procedentes da Venezuela.
Em consequência, explicou o Cel Coronel, houve um aumento dos preços do alcaloide nos mercados de consumo e, ao mesmo tempo, um acúmulo dos estoques da droga nos países de origem e de trânsito, como a Venezuela.
“Existe muita mercadoria escondida em diversos pontos da região andina à espera do momento adequado para ser retirada. A qualquer momento, pode ocorrer uma sobreoferta de drogas nos Estados Unidos ou na Europa”, alertou.
No caso da Venezuela, ele informou que os primeiros pontos para ocultamento da droga estão em Alto Apure, Bolívar e nas áreas de Catatumbo e Sur del Lago de Maracaibo, onde além do contrabando foram encontrados laboratórios e pistas clandestinas de pouso para pequenas aeronaves. Ele acrescentou que a droga que entra por Apure e Bolívar fica escondida em “pontos intermediários” em Guárico e Monadas, para tentar transportá-la mais tarde para Guiria, no nordeste do país.
No Relatório Estratégia Internacional de Controle de Narcóticos 2021, o Departamento de Estado dos EUA informa que a Venezuela é um país importante para o trânsito de cocaína através de rotas marítimas, terrestres e aéreas, e afirma que os voos suspeitos de tráfico de drogas decolam em grande parte de pistas clandestinas nos estados de Apure e Zulia, na fronteira com a Colômbia.
De acordo com Jeremy McDermott, diretor da InSight Crime, organização internacional especializada nas ameaças à segurança da América Latina, devido à atual crise econômica, não há exportações regulares a partir da Venezuela, onde possam estar ocultos carregamentos ilegais. “Assim sendo, o trânsito é feito para países como o Suriname ou a Guiana Francesa. São também utilizadas lanchas rápidas que chegam aos navios maiores na costa para entregar a droga”, explicou.
Ele disse ainda que, além do Exército de Libertação Nacional e das dissidências das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (FARC), também estão operando na Venezuela elementos do Clã do Golfo e das grandes quadrilhas como o Trem de Aragua, que estariam negociando o transporte de pequenas quantidades de drogas da fronteira entre a Venezuela e o estado colombiano de Norte de Santander para o interior do país.
“Sem cooperação internacional é muito difícil encontrar os esconderijos da droga”, ressaltou o Cel Coronel. “Depois que os carregamentos passam a fronteira e entram na Venezuela, é preciso rastreá-los até que cheguem a esses esconderijos. E esse trabalho é enorme”, afirmou.
Em 2005, a Venezuela cessou seus acordos de cooperação antidrogas com os EUA. Em 2020, o então procurador-geral dos EUA, William Barr, divulgou uma acusação penal que vincula Nicolás Maduro, militares e ministros do gabinete a atividades de tráfico de drogas junto com dissidências das FARC.
Segundo o relatório do Departamento de Estado dos EUA, a Venezuela não compartilha dados sobre o narcotráfico, nem fornece provas da destruição de drogas ilegais para os EUA.