O Dr. Richard Downie foi diretor do Centro para Estudos de Defesa Hemisférica William J. Perry, de março de 2004 a março de 2013. Nessa função, ele foi uma presença constante nas conferências anuais de segurança co-patrocinadas pelo Comando Sul dos EUA (SOUTHCOM, por sua sigla em inglês). O Centro está localizado na Universidade de Defesa Nacional, em Washington, D.C., e oferece treinamento de segurança e defesa ao pessoal do Comando Norte dos EUA (NORTHCOM, por sua sigla em inglês), SOUTHCOM, e às nações parceiras nas Américas.
O Dr. Downie, que agora é um sócio sênior na Deplhi Strategic Consulting, especializada em questões de segurança e defesa na América do Norte, América Latina e no Caribe, participou da Conferência de Segurança Centro-Americana (CENTSEC, por sua sigla em inglês) de 2017, em Cozumel, México, como moderador de uma mesa-redonda sobre a cooperação regional no combate às ameaças transnacionais na América Central. A Diálogo conversou com o Dr. Downie durante a conferência, em abril, para discutir, entre outros tópicos, as questões de segurança e defesa que afetam a região.
Diálogo: Qual é a importância do fato de o México ter sido o co-anfitrião da CENTSEC pela primeira vez?
Dr. Richard Downie: É muito importante que o México tenha sido o co-anfitrião, com o SOUTHCOM e o NORTHCOM, não só pela presença do país, mas também por apresentar uma função de liderança. E está, mesmo, assumindo a responsabilidade. O que vi nesta manhã durante minha sessão, que tratava da criação de uma rede de cooperação regional para tratar de ameaças transnacionais, é que precisamos de uma rede forte, com bons agentes, para combater a rede de maus agentes, e o que vimos hoje foi o estabelecimento de um acordo, em princípio, sobre todas essas questões. No fim, tudo se resume em como fazer essa cooperação acontecer e que tipo de cooperação é realmente necessária. Na minha opinião, o problema mais importante discutido hoje foi o compartilhamento de informações. Além disso, vi que em vez de ser apenas uma conferência onde as pessoas se conhecem, os chefes militares e outros líderes presentes realmente desejam avançar no sentido de criar essa rede e tomar as medidas necessárias para criar a cooperação de que precisam para tratar dessas ameaças transnacionais na região.
Diálogo: Na sua opinião, qual deve ser o próximo passo para atingir um resultado concreto?
Dr. Richard Downie: Acredito que o valor real da participação do México é o de assumir uma função de liderança. Os Estados Unidos fizeram muito pela região e a intenção do México de assumir agora essa posição de liderança é de extrema importância. Hoje vimos essa responsabilidade, pois o país é líder na região e está assumindo outras funções de liderança, como em relação à Câmara de Defesa Inter-americana e à reunião de ministros de defesa [Conferência de Ministros de Defesa das Américas]. Acredito que sua capacidade e vontade de assumir parte das funções de liderança na América Central fará uma diferença significativa.
Diálogo: Essa posição está em perfeito alinhamento com o que o Almirante-de-Esquadra Kurt Tidd, comandante do SOUTHCOM, pretende para a região, certo?
Dr. Richard Downie: Exato. O Alte Esq Tidd é enfático sobre a tentativa de criar esses relacionamentos [com outras nações parceiras], mas ele entende as limitações. Quais são essas limitações? Precisamos nos aprofundar um pouco mais sobre elas. Foi isso que tentei fazer, hoje, durante minha sessão: chegar à essência de quais são os problemas que estão nos impedindo de dar o próximo passo e isso é o que ele deseja atingir. Nesse ponto, podemos decidir fazer o que quisermos. Porém, precisamos ter cobertura política. Deve haver algum tipo de estrutura, acordo, ou uma decisão legislativa internacional, para que se faça algo, para fazer avançar este nível de cooperação. Caso contrário, acaba sendo apenas outra conferência, outra discussão e “espero que façamos algo no próximo ano”. Espero que tenhamos chegado ao ponto que precisávamos para fazer um avanço.
Diálogo: O senhor acredita que o motivo de convidar os ministros de defesa para esta conferência foi para realmente atingir um objetivo? Pois generais e almirantes podem se reunir e tomar decisões, mas há sempre o lado político a se considerar, certo?
Dr. Richard Downie: Esse é exatamente o ponto. O problema é que falta algo. Temos, de fato, essas grandes conferências, como a CENTSEC, mas não está acontecendo o que é necessário para fazer uma diferença real contra essas ameaças transnacionais. Portanto, o que estamos tentando descobrir, ou, pelo menos, o que tentei estabelecer durante minha sessão, é o passo que precisamos dar para chegar lá. A dificuldade está aí. Quero dizer, não é fácil compartilhar esse tipo de informação. Levantamos a questão [durante a mesa-redonda] de que havia um avião russo se aproximando do espaço aéreo dos EUA, próximo ao Alasca; os jatos decolaram para interceptar a aeronave; esses jatos eram dos EUA e do Canadá. Esse é um feito notável, jatos dos dois países trabalhando juntos para interceptar aviões russos. Esse nível de confiança é um verdadeiro exemplo para o mundo. Mas isso não aconteceu da noite para o dia; isso foi o resultado de décadas de esforço, para gerar esse nível de cooperação e de confiança. Esse foi o ponto de destaque do Alte Esq Tidd nessa manhã: temos que criar essa confiança e temos que começar de algum lugar. Este foi o primeiro passo. Estamos discutindo o assunto, mas ainda não chegamos lá.
Diálogo: Cada vez mais, vemos as forças armadas de alguns países dando apoio à sua polícia. O senhor vê isso como uma tendência ou acredita que, de alguma forma, as forças armadas voltarão para a sua função original, que é proteger a soberania dos países?
Dr. Richard Downie: Acho que o que vemos, em especial nos comentários de El Salvador e Honduras, é que não querem forças militares assumindo a função de polícia. El Salvador, Belize, Honduras e Guatemala, todos discutiram a necessidade de ter forças militares envolvidas no apoio à polícia, não para fazer o trabalho da polícia, apenas porque a polícia não tem tal capacidade. Leva algum tempo para aumentar não apenas o tamanho da polícia, mas também a capacidade dessa polícia, para funcionar como o fazem no momento. Porém, o ministro da Defesa de El Salvador, General-de-Exército Munguía Payés, disse: “vocês precisam visitar alguns de nossos bairros para entender”. Esse não é um problema de segurança pública. É muito mais do que isso. O que eles veem não é o que entendemos como um problema típico da polícia. As forças armadas estão concentrados naquilo que é, essencialmente, um grande problema policial. O que ele está dizendo e o que vemos também em outros países – tenho a certeza de que isso também ocorre no triângulo do norte – é que isso é muito mais do que um problema de policiamento. Precisamos estar aqui para entender. Esse é um enorme esforço que a polícia sozinha não consegue resolver.