Em uma tentativa de expandir sua influência na América Latina, o Irã está intensificando sua pressão para obter um pouco de poder por meio de acordos estratégicos, como o recente tratado de cooperação em segurança e defesa assinado com a Bolívia, que representa um risco para a paz e a estabilidade na região, afirmam os especialistas em segurança.
O tratado, assinado em 26 de julho entre o General de Brigada Mohammad Reza Ashtiani, ministro da Defesa do Irã, e seu homólogo boliviano Edmundo Novillo, prevê o destacamento de drones fabricados pelo Irã no território boliviano, que, segundo Novillo, serão usados para combater o narcotráfico e monitorar as fronteiras, informou a agência de notícias oficial iraniana IRNA.
Em um movimento desesperado, o Irã está tentando aumentar suas exportações de defesa para melhorar um pouco sua economia abalada, onde um dólar americano custa meio milhão de rials, observou o Instituto de Estudos de Guerra dos EUA. Em 25 de maio, o Centro de Estatísticas do Irã informou que sua taxa de inflação era de 46,1 por cento.
“Esse acordo disfarçado de combate ao narcotráfico é uma piada. O Irã tem o Hezbollah envolvido no narcotráfico, lavando dinheiro do Líbano para os cartéis mexicanos, colombianos e da tríplice fronteira”, disse à Diálogo Jorge Serrano, especialista em segurança e assessor da Comissão de Inteligência do Congresso do Peru, em 26 de agosto.
“O aumento do narcotráfico, do contrabando e das alianças com ‘Estados desonestos’ está prejudicando a América Latina; os índices de criminalidade em relação a essas questões aumentaram,” indica na internet a diretoria internacional de Assuntos Latino-Americanos da organização judaica B’nai B’rith. “A renovação dos laços por meio de acordos ocultos aumenta a preocupação e o mal-estar de todos, sem exceção.”
Rede estatal e não estatal
O avanço iraniano na Bolívia e na região se baseia na aliança militar entre La Paz e Caracas, para influenciar as políticas externas dos governos latinos, promovendo posições antidemocráticas, publicou em um artigo de opinião Joseph Humire, diretor do think tank Centro para uma Sociedade Livre e Segura, em 17 de agosto.
“O Irã está maximizando sua influência geopolítica no hemisfério ocidental, ao posicionar ativos e equipamentos militares na região”, destacou Humire.
“O Irã está avançando sua capacidade de infiltrar-se em toda a América Latina, com base nos laços que mantém com o regime venezuelano”, comentou Serrano. “A Venezuela é o principal promotor da infiltração da estratégia do Irã na região, em cumplicidade com os serviços de inteligência de Cuba.”
Teerã busca estabelecer uma rede de presença estatal e não estatal na América Latina, replicando sua abordagem no Oriente Médio. A Venezuela está liderando essa iniciativa, reafirmou Humire.
A aliança La Paz-Irã já afeta a dinâmica política e de segurança da região, diz Serrano.
Argentina
O acordo de defesa entre a Bolívia e o Irã causou preocupação ao governo argentino, que entrou em contato com o embaixador boliviano em Buenos Aires, para perguntar sobre o memorando firmado por Novillo em Teerã. Enquanto isso, a comunidade judaica argentina advertiu que tal acordo equivale a “ter o inimigo ao seu lado”, informou World Politics Review.
De acordo com o jornal espanhol La Razón, os drones iranianos na Bolívia poderiam ser destinados a apoiar o trabalho de inteligência do Irã, em vez de se concentrarem apenas na luta contra o narcotráfico.
Novillo minimizou a importância das inquietudes da Argentina, argumentando que a Bolívia busca obter drones iranianos apenas para proteger suas fronteiras e combater o narcotráfico. Ele classificou as críticas como “exageradas”, informou IRNA. O novo acordo de defesa entre Bolívia e Irã não foi publicado.
Lugar especial
“Os países da América do Sul ocupam um lugar especial na política externa e de defesa do Irã, porque estão localizados em uma área muito sensível”, admitiu Ashtiani em sua reunião com Novillo, informou a BBC.
Nesse contexto, o presidente iraniano Ebrahim Raisi visitou em junho Venezuela, Nicarágua e Cuba, que enfrentam sanções dos EUA, para reforçar os “ideais revolucionários próprios da ideologia islâmica populista”, informou o jornal Arab News.
“Apesar dos altos níveis de corrupção e da falta de liderança, as Forças Armadas da Venezuela são as primeiras na América Latina a ter drones armados em seu inventário, cortesia do Irã. Em 2021, a Venezuela começou a receber envios de mísseis de precisão de curto alcance fabricados no Irã, que provavelmente serão usados para armar os drones”, disse Humire. “Entregues sob a aparência de remessas de carga comercial de fabricantes de automóveis iranianos, o episódio refletiu o domínio do Irã sobre transferências de uso duplo e sua notável capacidade de misturar projetos comerciais e militares.”
“As democracias da América Latina devem estabelecer uma estratégia combinada, conjunta e complementar de alto nível, para enfrentar as ameaças comuns, porque isoladamente não conseguirão fazê-lo. [O Irã] é uma ameaça transnacional que afeta a região”, concluiu Serrano.