A recente visita de uma delegação iraniana à Venezuela marca um novo capítulo na já robusta aliança estratégica entre os dois países. Isso levanta questões sobre as implicações para a estabilidade regional e global. De acordo com o Ministério das Relações Exteriores da Venezuela, a reunião de 11 de março teve como objetivo analisar a cooperação bilateral.
Ambos os países, sob regimes autocráticos e enfrentando sanções internacionais por violações aos direitos humanos, estão buscando combater seu isolamento dos mercados globais por meio de um maior envolvimento, diz um relatório da Grey Dynamics, uma empresa de inteligência com sede em Londres.
Tanto o regime venezuelano quanto o iraniano estão estreitando suas relações com a China e a Rússia, afirmou Grey Dynamics. Nos próximos meses, Caracas e Teerã aumentarão suas relações em política, energia e defesa.
Essa crescente colaboração é uma clara indicação de que Teerã usa a nação sul-americana como base e porta de entrada para atividades hostis na região, disse à Diálogo, em 26 de março, Jorge Serrano, especialista em segurança e membro da equipe consultiva da Comissão de Inteligência do Congresso do Peru,.
Capacidades
Um vídeo, publicado no YouTube pelas Forças de Defesa de Israel (FDI), destaca os esforços da República Islâmica para aumentar sua influência na Venezuela, devido à localização estratégica do país e às oportunidades financeiras ligadas ao narcotráfico.
O vídeo detalha como o regime iraniano canaliza armamentos para a Venezuela, usando rotas aéreas e marítimas, com sistemas capazes de viajar milhares de quilômetros. Um exemplo disso é a presença do drone Mohajer 6, de fabricação iraniana, que pode transportar até quatro mísseis ar-superfície, que o regime exibiu recentemente em um desfile militar em Caracas.
Serrano mencionou que “essa estratégia faz parte de uma aliança mais ampla para facilitar a infiltração contínua do Irã na América Latina, permitindo que realize operações de inteligência de forma eficaz”.
Além da transferência de armas, foram identificados barcos iranianos com mísseis ao longo da costa noroeste da Venezuela. Embora seu alcance de navegação seja limitado, eles carregam mísseis de longo alcance, afirma FDI.
Joseph Humire, diretor do Centro para uma Sociedade Livre e Segura, comparou a importância estratégica da Venezuela para o Irã com o papel que a Síria desempenhou no Levante, facilitando o armamento e o financiamento do Hezbollah, informou o jornal britânico Daily Mail, em 10 de março.
“O conflito entre a Rússia e a Ucrânia complicou ainda mais o cenário, fortalecendo a aliança entre Bolívia, China, Cuba, Irã, Nicarágua, Rússia e Venezuela, para construir capacidades conjuntas e interoperabilidade”, observou Serrano. “Isso concede ao Irã, apoiado pelo Kremlin, maior liberdade de ação na região.”
Narco-cooperação
Nesse cenário, há uma interação complexa entre os cartéis de drogas mexicanos e os três principais países andinos produtores de coca: Bolívia, Colômbia e Peru. “No Peru, vimos um salto na produção de folhas de coca para o processamento de cocaína, de 240 para quase 800 toneladas”, indicou Serrano.
“Esse aumento coincide com a atuação mais livre e agressiva do regime iraniano na região, que, conhecido por ajudar o comércio ilegal de drogas tóxicas por meio de ligações terroristas, encontra nesse cenário o ambiente ideal para aprofundar seu envolvimento com os cartéis no narcotráfico”, acrescentou.
A área da Tríplice Fronteira entre Argentina, Brasil e Paraguai, já conhecida por sua densa atividade de contrabando e tráfico de drogas, está vendo como o Hezbollah fortalece sua presença, destaca a plataforma alemã DW. A área se tornou um centro de lavagem de dinheiro e recrutamento para a organização, demonstrando a fusão entre o crime e o terrorismo.
Serrano observa que o crescimento do narcotráfico e do terrorismo geralmente leva a mais corrupção e erosão democrática. “Para o Irã, fomentar o caos e o crime na América Latina beneficia seus interesses de minar democracias, facilitar operações subversivas e capacitar organizações do crime organizado.”
Ele também destacou o interesse do Irã nas reservas de urânio da Venezuela, um elemento crucial para seu programa nuclear. Esse interesse não se limita ao território venezuelano. A Bolívia e o Peru também são importantes por seus recursos estratégicos, destacando a importância geopolítica desses países para Teerã.
De acordo com Humire, a China usa o Irã como intermediário para realizar muitas de suas ações no hemisfério ocidental, protegendo assim suas relações diplomáticas com os Estados Unidos e outros países, informou Daily Mail. Ele também observou que o Irã está disposto a cooperar com isso, pois não tem capital político para arriscar.
Reeleição
Na área da cooperação econômica entre a Venezuela e o Irã, “o apoio econômico iraniano se tornou um pilar para equilibrar o orçamento venezuelano, permitindo que a ditadura de Nicolás Maduro subsidie seus projetos, com o objetivo de garantir sua reeleição”, declarou Serrano.
Após as eleições presidenciais, de acordo com Serrano, Maduro usará esse apoio econômico para continuar e possivelmente intensificar seu apoio financeiro a Cuba, bem como para patrocinar campanhas políticas na região e executar operações de inteligência.
Por todas essas razões, “os líderes devem instar seus serviços de inteligência a realizar avaliações atualizadas sobre ameaças complexas e multidimensionais, bem como fomentar uma aliança regional, apoiada por potências como os Estados Unidos e a União Europeia, para enfrentar essas ameaças e proteger a população”, reiterou Serrano.