As coisas foram tão bem por tantos anos em Trinidad e Tobago que os habitantes repetiam a máxima “Deus é trinitinoâ€. Durante os bons tempos, os lucros decorrentes das exportações de gás natural e petróleo tornaram essa nação caribenha uma das mais ricas do Hemisfério Ocidental. Mas a recente queda nos preços internacionais do petróleo levou o paÃs a enfrentar tempos mais difÃceis.
Agora o paÃs enfrenta uma nova ameaça: o possÃvel crescimento de terrorismo dentro de suas fronteiras. Para entender por que isso poderia ser uma importante preocupação para o paÃs, Diálogo conversou com o General de Brigada Rodney Smart, Chefe do Estado Maior da Força de Defesa de Trinidad e Tobago, durante a XIV Conferência de Segurança das Nações do Caribe (CANSEC) realizada em em Kingston, na Jamaica.
Diálogo : Muito foi dito na CANSEC 2016 sobre um possÃvel crescimento do terrorismo no Caribe. Por algum motivo, Trinidad e Tobago foi mencionado mais vezes que outros paÃses. Isto se deve ao paÃs ter a maior população muçulmana da região?
General de Brigada Rodney Smart : É possÃvel. Em 1990, uma organização muçulmana tentou derrubar o governo eleito do paÃs, o que ficou sempre em nossa memória. Mais recentemente, você deve ter ouvido falar de um vÃdeo que circulou na internet mostrando trinitinos que foram combater com o Estado Islâmico (ISIS) . A mensagem foi usada para tentar recrutar jovens de Trinidad e Tobago [TTO]. A partir dessa perspectiva, temos a preocupação de que TTO continue sendo um dos paÃses onde o recrutamento ocorre. TTO é um dos paÃses de onde pessoas saÃram para lutar na SÃria, retornando depois. Realmente nos preocupamos com o potencial terrorismo em nosso paÃs. E observe a palavra que usei: potencial. Acredito que não ocorrerá, mas nos preocupamos. Por isso precisamos implementar estratégias.
Diálogo : Durante sua apresentação na CANSEC 2016, o senhor disse que uma forma de conter essa ameaça seria enviar mensagens positivas, especialmente aos jovens. O que o paÃs tem feito nesse sentido?
Gen Brig Smart : Em TTO, temos diversos programas para jovens, alguns gerenciados por militares. Através desses programas, esperamos influenciar as mentes dos jovens e mostrar que existem melhores alternativas que as oferecidas por grupos como o ISIS. Também estamos nos tornando mais vigilantes em termos de redes sociais e dos efeitos e mecanismos usados nas redes sociais pelas pessoas do outro lado. Essas são duas coisas imediatas que posso dizer que estão acontecendo. Jovens estão falando aos jovens. Vejo jovens indo à TV para desencorajar outros jovens. Com argumentos suficientes para mostrar que isso – o que é mostrado aos seus pares – não é uma boa alternativa.
Diálogo : Em sua opinião, por que os paÃses não estão reagindo com rapidez para deter o que os terroristas estão fazendo, especialmente com respeito ao uso de redes sociais?
Gen Brig Smart : Como os paÃses normalmente não têm um mecanismo de comunicação com seus jovens, não têm programas implementados e estabelecidos para se comunicar com a juventude. No entanto, os terroristas usam esse espaço porque reconhecem que este é um mecanismo através do qual os jovens se comunicam. Os paÃses acabarão recuperando o atraso, mas, como este não é seu modo normal de comunicação, estão usando abordagens convencionais. Creio que atingimos um ponto em que os paÃses reconhecem que devem agora usar as redes sociais para se comunicar com os jovens.
Diálogo: Falando especificamente sobre tráfico ilÃcito, alguns anos atrás TTO teve de instituir um toque de recolher devido ao crescimento da violência, especialmente entre os jovens. Qual a situação atual do paÃs?
Gen Brig Smart : Ter instituÃdo um toque de recolher é o que chamamos de Estado de Emergência para lidar com situações de criminalidade em qualquer momento. E funcionou. O nÃvel de violência diminuiu, especialmente o número de homicÃdios. Vimos que é preciso destinar recursos continuamente para essa área. Precisamos analisar permanentemente os bancos de dados. Mais recentemente, o primeiro ministro de Trinidad e Tobago (Keith Rowley) – ao reconhecer que houve um pico (de violência) no inÃcio de 2016 – pediu que os militares trabalhassem com a PolÃcia de um modo mais definitivo para evitar que o pico observado prevaleça e levar os responsáveis pela violência à Justiça.
Diálogo : Acredita que a Força de Defesa tem foco cada vez mais nas chamadas novas ameaças, como fazem as Forças Armadas de paÃses como a Colômbia?
Gen Brig Smart : Eu diria que as Forças Armadas caribenhas sempre foram diferentes das Forças Armadas da maioria dos paÃses desenvolvidos. Veja o caso das Forças Armadas ou Forças Regulares dos Estados Unidos, cuja finalidade é realmente externa aos EUA, regida pela posse comitatus [lei que impede o uso de forças militares em tarefas de policiamento dentro do paÃs], mas há capacidades militares disponÃveis aos estados através da Guarda Nacional. No entanto, paÃses pequenos são incapazes de ter uma força militar permanente como a Guarda Nacional. As capacidades dos pequenos paÃses sempre foram usadas não só para segurança, mas para finalidades de desenvolvimento. Em nações pequenas, o modelo militar é diferente do que existe em paÃses maiores. Mas eu também diria que, por exemplo, o Reino Unido tem uma história de uso de tropas internamente para tarefas como assistência a vÃtimas de inundações. A resposta a desastres não é nova para militares como os do Reino Unido. O modelo depende da situação de cada um.
Diálogo: O senhor mencionou o Reino Unido porque Trinidad e Tobago é parte da Commonwealth, certo?
Gen Brig Smart : Sim. Trinidad não é único. Em outros paÃses da Commonwealth, você verá um modelo similar. A Grã-Bretanha sempre usou suas forças dentro e fora do paÃs. As chances de vermos tropas dos EUA sendo usadas nas cidades americanas são muito pequenas. Trata-se de um modelo diferente.
Diálogo : O que espera do Almirante Kurt Tidd, novo Comandante do Comando Sul dos EUA ?
Gen Brig Smart : Há muita expectativa sobre seu trabalho porque o Almirante de Esquadra [do Corpo de Fuzileiros Navais dos EUA] General [John F.] Kelly (ex-Comandante do SOUTHCOM) foi excepcional, um excelente amigo da Força de Defesa de Trinidad e Tobago; foi um grande apoio. Mas acabo de vir de um encontro bilateral com o Alte Esq Tidd e estou convencido de que será outro parceiro muito disposto e capaz. Estou ansioso e entusiasmado por trabalhar com ele e com o General [Clarence K.K.] Chinn [Comandante do Exército Sul dos EUA]. Agora existe um novo compromisso relativo aos soldados do Exército de Trinidad e Tobago, ao Regimento. Há uma nova relação viabilizada pela Oficial de Ligação Militar dos Estados Unidos, Coronel Claudia Carrizales. A Cel Carrizales possibilitou essa relação entre o Exército Sul e o Regimento de Trinidad e Tobago. Então, eu diria que, no âmbito estratégico – no âmbito do SOUTHCOM –, vejo um compromisso permanente entre as duas organizações. Mas mesmo em um nÃvel abaixo, o Gen Chinn já assegurou que exista uma relação em vigor. Em poucas palavras, vejo a relação ficando ainda mais forte, se é que isso seja possÃvel.