As redes de tráfico internacional de venezuelanos cresceram em pelo menos 19 países, aproveitando a crise humanitária que embarga esse país sob o regime de Nicolás Maduro.
Essa é uma das principais revelações do último relatório sobre tráfico de pessoas emitido pelo Departamento de Estado dos EUA. Divulgado na primeira semana de julho de 2021, o documento indica que durante o ano de 2020 foram detectados casos de tráfico e exploração de emigrantes venezuelanos em Aruba, Bahamas, Bolívia, Brasil, Colômbia, Costa Rica, Curaçao, Equador, Espanha, Guiana, Haiti, Islândia, Macau, México, Panamá, Peru, República Dominicana, Suriname e Trinidad e Tobago.
Um exemplo disso é a história de Katherin, que, de acordo com o relatório, pagou US$ 1.500,00 para sair da Venezuela para a Guiana. Ali lhe ofereceram um emprego como empregada bilíngue em um local da capital, Georgetown. Ao chegar, percebeu que a realidade era outra: ela se viu forçada a permanecer na mesma residência de seu chefe, e não no apartamento de aluguel gratuito que lhe haviam prometido. Depois de três meses, só havia economizado US$ 23,00.
Segundo Sara Fernández, investigadora do Centro de Justiça e Paz (Cepaz), organização não governamental venezuelana de direitos humanos, a crise humanitária na qual a Venezuela está submersa desde 2016 faz com que os potenciais migrantes sejam “presas fáceis” das redes organizadas de tráfico e exploração humana.
“Dizem a eles que, se forem embora, poderão reconstruir suas vidas […]. A falta de documentos de identidade faz com que quando chegam ao país de destino não podem se locomover, o que lhes dificulta a denúncia”, afirmou a representante da ONG.
Geralmente, os casos detectados na Venezuela não são relatados oficialmente pelas autoridades, mas sim de forma informal, através das redes sociais. Não obstante, no dia 30 de julho, Tarek William Saab, fiscal designado pela extinta Assembleia Nacional Constituinte, revelou que de 2017 a 2021 foram registradas 696 vítimas do tráfico de venezuelanos.
De acordo com a porta-voz da Cepaz, devido ao progressivo isolamento internacional, a Venezuela não participa ativamente dos mecanismos de coordenação para a luta contra as redes que facilitam o traslado e a exploração de venezuelanos no exterior.
Esses grupos atuam com relativa impunidade. Segundo Carolyn Gomes, diretora executiva da Coalizão de Comunidades Vulneráveis do Caribe, desde 2017, essas organizações já levaram a Trinidad e Tobago 21.000 venezuelanos de forma clandestina.
Durante uma apresentação diante da Comissão Interamericana de Direitos Humanos, em junho, a especialista advertiu que as redes internacionais de tráfico humano a partir da Venezuela em direção ao arquipélago caribenho “se exacerbaram”.
“Esses casos frequentemente estão vinculados à exploração sexual: as pessoas são obrigadas a fazer sexo para não serem deportadas […]”, disse.
A situação não parece ter uma solução imediata. De acordo com Luis Cedeño, diretor do Observatório Venezuelano do Crime Organizado, à medida que a crise na Venezuela se aprofunda, a diáspora se agravará e continuará levando as pessoas a saírem do país em condições de alta vulnerabilidade. O relatório do Departamento de Estado dos EUA indica que até o momento 5,6 milhões de pessoas já saíram da Venezuela.
“Esse fato está diretamente ligado à complexa crise humanitária”, disse Cedeño.