A Rússia anunciou que planeja instalar uma estação terrestre GLONASS para a navegação por satélite na Venezuela. O sistema GLONASS é análogo ao GPS dos EUA e ao Galileo europeu. A agência espacial russa Roscosmos disse que o destacamento da estação faz parte do acordo entre Moscou e Caracas sobre cooperação na exploração e uso do espaço sideral, ratificado em junho de 2022.
O anúncio já foi feito no passado sem nunca se materializar, informou o site argentino Infobae. Em dezembro de 2018, Nicolás Maduro, através de sua conta no Twitter, havia anunciado a breve instalação do sistema para “melhorar as telecomunicações”.
Para o especialista em segurança internacional Joseph M. Humire, diretor do think tank Centro para uma Sociedade Livre e Segura, com sede em Washington, D.C., isso “faz parte da estratégia [da Rússia] para mover a América Latina para uma zona de conflito”, disse à Diálogo, em 14 de agosto de 2022.
Uma base semelhante instalada na Nicarágua levanta suspeitas de espionagem e está envolta em segredo. Como foi relatado em março de 2022 pelo diário guatemalteco Prensa Libre, a base monitora as ligações da Embaixada dos EUA e faz parte da vigilância eletrônica e telefônica realizada pelo Instituto Nicaraguense de Telecomunicações e Serviços Postais.
A Rússia também possui quatro estações terrestres GLONASS no Brasil, três na Antártica e uma na África do Sul. O Kremlin tem planos de instalar mais sistemas na Argentina, Brasil, Cuba e Equador, “para normalizar sua presença militar, realizar exercícios conjuntos e ter rotineiramente seus navios, soldados e pessoas na América Latina”, disse Humire. “O México também poderia estar sob o olhar geopolítico da Rússia.”
Sistema de drones
A Rússia planeja fortalecer seu “triângulo do Caribe” (Venezuela, Cuba e Nicarágua) com bases de satélites e estações de radar, para espionar os países da região e informar sobre seus movimentos militares e civis, o que o GLONASS pode facilitar. Caracas tem várias estações desse tipo, a partir das quais operam drones de fabricação chinesa e iraniana, a maioria em estados fronteiriços com um alcance até Bogotá, informou o diário espanhol ABC.
Humire considera que os sistemas de drones são uma das questões menos abordadas na América Latina. Os drones são capazes de voar por debaixo das áreas que as forças aéreas regionais normalmente monitoram com radar e sistemas de controle aéreo, disse.
Os sistemas de drones precisam de satélites e “o GLONASS poderia dar-lhes mais capacidade de voo e isso pode ser usado para desestabilizar as fronteiras”, afirmou Humire.
Os drones permitem uma vigilância “de baixo para cima”, permitindo que um Estado vigie e intervenha em questões tanto dentro como fora do país, longe de sua fronteira imediata, por exemplo, avaliando os padrões de migração e observando as atividades em países vizinhos, indica o relatório Cruzando uma linha, o uso de drones para controlar as fronteiras, da ONG britânica Drone Wars.
“O resultado é uma rede invisível, que cresce silenciosamente, com a qual o Estado é cada vez mais capaz de observar e se intrometer na vida dos cidadãos”, diz o relatório. “Um drone que tenha voado perto da fronteira de um Estado vizinho, com o qual as relações não são boas, pode ser considerado uma provocação e ter consequências perigosas.”
Longo prazo
“A longo prazo, a Rússia está procurando que a América Latina seja hostil com os Estados Unidos, e não apenas os governos, mas que os cidadãos [latino-americanos] comecem a pensar que os Estados Unidos são corruptos, são maus”, declarou Humire. “Isso afetará não apenas o governo dos EUA, mas os próprios cidadãos, pois os coloca numa situação em que é mais perigoso para um norte-americano viajar por turismo ou a negócios para a região.”
A General de Exército Laura J. Richardson, do Exército dos EUA, comandante do Comando Sul dos EUA (SOUTHCOM), disse em 24 de março que a Rússia e a China “estão expandindo agressivamente sua influência em nossa vizinhança, na América Latina e no Caribe, causando ainda mais insegurança e instabilidade”, informou a plataforma norte-americana Voz da América.
“O SOUTHCOM e o Comando Norte dos EUA têm que começar a trabalhar como um só comando para mudar a dinâmica, para construir capacidades conjuntas com a América Latina, para ter mais laços de coordenação e cooperação. Se nós não o fizermos, a Rússia e a China certamente o farão”, concluiu Humire.