Em março de 2017, o Peru foi afetado por El Niño Costero, um fenômeno meteorológico caracterizado pelo aquecimento anormal do mar sobre o litoral do país e também do Equador. No Peru, El Niño Costero deixou mais de 100 mortos e afetou quase um milhão de pessoas em todo o país em 2017. No entanto, apesar da tragédia, o Peru foi coanfitrião da Conferência Sul-Americana de Defesa 2017 (SOUTHDEC, por sua sigla em inglês), juntamente com os Estados Unidos, por meio do Comando Sul (SOUTHCOM). O ministro da Defesa peruano Jorge Nieto Montesinos falou aos participantes na cerimônia de abertura do evento. Diálogo aproveitou a oportunidade para conversar com ele sobre temas atuais de segurança nacional.
Diálogo: Muitos dos países presentes à SOUTHDEC ajudaram o Peru durante os esforços de assistência humanitária logo após o fenômeno El Niño Costero.
Ministro da Defesa do Peru Jorge Nieto Montesinos: Quero agradecer-lhes por isso e também a todos os países, como também ao governo, mas a todos os que estão aqui, que nos apoiaram durante a emergência no verão deste ano, ajudando com materiais, como, por exemplo, equipamentos para poder responder à emergência que tivemos que enfrentar naquele momento. Quero reforçar que sua ajuda foi muito útil e que nossas Forças Armadas e o governo como um todo souberam auxiliar de maneira eficaz em favor de nossos cidadãos.
Diálogo: Como o Ministério da Defesa participa da etapa de reconstrução?
Ministro Nieto: Estamos muito orgulhosos pela participação de nossas Forças Armadas durante El Niño Costero. O Almirante-de-Esquadra [José] Paredes [chefe do Comando Conjunto das Forças Armadas do Peru] está comigo. Foi ele quem conduziu a operação de mobilização das Forças Armadas naquele momento. Agora estamos na fase de reconstrução. Estamos apoiando as tarefas que nos solicitam. Estamos esperando que o processo avance, que o projeto se desenvolva. Estaremos na expectativa daquilo que nos indiquem sobre como participar.
Diálogo: Qual é a importância para o Peru de organizar a Conferência Sul-Americana de Defesa juntamente com os Estados Unidos?
Ministro Nieto: Quero, em primeiro lugar, agradecer por esta reunião ser realizada em nosso país nesta oportunidade. É uma prova de amizade, mas também de confiança nas possibilidades de realizar com pertinência os trabalhos que a organização de uma reunião assim administra. A reunião que começa hoje tem uma importância muito grande. Ela tem o objetivo de discutir experiências com respeito aos temas do terrorismo, da defesa cibernética e aos tópicos relacionados com o tráfico, especialmente o narcotráfico. As experiências de vários países ao enfrentar esses problemas são coletadas. Os conhecimentos são compartilhados e, dessa forma, busca-se melhorar a capacidade das nossas Forças Armadas para enfrentar os problemas que nos esperam.
Diálogo: Estes problemas ou ameaças são novos?
Ministro Nieto: Há poucos anos, pensávamos que estávamos entrando em um mundo muito mais seguro, mas, após mais de uma década, a realidade não é essa. Temos as incertezas que existiam no passado, talvez modificadas. Agora há um novo tipo de incerteza. Como diz um velho autor, aquelas incertezas faziam parte da nossa falta de conhecimento sobre o mundo. Essas incertezas são, muitas vezes, resultado do nosso conhecimento sobre o mundo. O fenômeno típico é o da mudança global que decorre totalmente da nossa ação como seres humanos e da nossa capacidade de desenvolvimento aplicada à produção sem os controles necessários para evitar esse aspecto, o ambiente em que vivemos. Portanto, essas novas incertezas, que muitas vezes derivam de nosso conhecimento, precisam ser analisadas em todas as suas perspectivas, pois são fenômenos globais e vistos em muitos lugares do mundo. Por isso, geram muitas perspectivas, a partir das quais é possível se observar. Portanto, precisamos de reuniões como esta, que nos permitam a troca, a análise e a evolução, porque enfrentamos fenômenos muitas vezes novos, ou fenômenos antigos que ganham nova forma, mas sobre os quais estamos recebendo informações, experiências e conhecimentos. É necessário colocar tudo sobre a mesa e trocar ideias, para aprendermos juntos e podermos encontrar as formas adequadas para tornar nosso mundo mais seguro.
Diálogo: O que o Ministério da Defesa está fazendo com as Forças Armadas para diminuir a produção de cocaína no Peru?
Ministro Nieto: O tema do narcotráfico é de competência da nossa Polícia Nacional, que faz um esforço imenso para poder combatê-lo. Nossas Forças Armadas, especialmente no Vale dos Rios Apurímac, Ene e Mantaro (VRAEM), têm uma responsabilidade e apoiamos o trabalho da nossa Polícia Nacional. Estão tomando todas as medidas necessárias para poder controlá-lo. Como é sabido, o fenômeno do tráfico de cocaína não é algo que tenha solução somente policial ou somente militar. Há um conjunto de problemas que precisam ser enfrentados para poder reduzi-lo, desde o tema global da demanda que existe para esse tipo de produto até tudo o que tem relação com os produtos químicos necessários para sua produção ou a circulação do dinheiro através do circuito financeiro, permitindo controlar esse processo, essa atividade de crime internacional, de forma precisa. Nossas Forças Armadas estão agindo permanentemente. Acabamos de receber vários relatórios do VRAEM nesse sentido e estamos trabalhando intensamente nisso. Tanto é assim que o fenômeno começa a ser modificado em nosso país e nas regiões onde antes o trabalho dos grupos criminosos era mais enraizado. Eles agora estão se mudando para outras regiões do país. Estamos trabalhando também para ter todas as informações sobre isso. Recentemente, tivemos uma conversa com o ministro da Defesa do Brasil [Raul Jungmann] sobre este tema para trabalharmos juntos, de forma combinada, em nossa fronteira comum, responsabilizando-nos pelo problema, porque ele é transnacional.
Diálogo: O Sendero Luminoso ainda está presente no VRAEM?
Ministro Nieto: O que existe no VRAEM são remanescentes, resquícios do que foi o Sendero Luminoso. Na verdade, é um clã de uma família, Quispe Palomino, que já abandonou praticamente toda a estratégia de poder e está dedicado basicamente a oferecer serviços de cobertura e de deslocamento aos narcotraficantes, de modo que o problema ainda está ali. A situação geográfica no VRAEM é muito complexa. É uma selva muito complicada, muito densa e com muitas complicações geográficas. Eles estão basicamente em toda a região e estamos contornando este problema para conter suas ações.