A oficial foi transferida, desde o início de julho de 2019, para o Centro de Instrução Almirante Sylvio de Camargo, no Rio de Janeiro, e vai trabalhar na Escola de Operações de Paz de Caráter Naval, responsável pela preparação dos militares da MB que participam de operações de paz da ONU ou dos compromissos internacionais firmados pela MB.
O prêmio, recebido em 29 de março de 2019 das mãos do Secretário-Geral da ONU, António Guterres, foi resultado do trabalho realizado como assessora militar de gênero na Missão Multidimensional Integrada das Nações Unidas para a Estabilização da República Centro-Africana (MINUSCA, em francês). A oficial esteve na República Centro-Africana (RCA) durante o período de abril de 2018 até abril de 2019.
Em entrevista à Diálogo, a CC Márcia atribuiu a premiação à dedicação empregada durante o trabalho na MINUSCA. “Foi uma luta pessoal. Nunca me dediquei tanto a algo como à proteção dos civis”, relembrou. “Não poderia ter uma maneira melhor de fechar esse ciclo da minha missão na RCA. Ser reconhecida é muito bom e, em nível internacional, é algo que nem nos meus melhores sonhos eu imaginava.”
A oficial também foi homenageada pelo governo brasileiro com a Medalha da Vitória, do Ministério da Defesa, entregue no dia 5 de abril de 2019 pelo presidente da República Jair Bolsonaro. “Isso mostra que, assim como a ONU, o Brasil reconhece como são importantes a questão de gênero e a proteção aos civis”, disse a CC Márcia.
O objetivo da sua missão foi empregar a perspectiva de gênero dentro do componente militar, visando evitar as violações de direitos humanos. Não havia, até o momento, um trabalho semelhante desenvolvido na MINUSCA. “Montei um plano de ação do zero, desde a aquisição de pessoal até o engajamento com a população local.”
Segundo a CC Márcia, foram definidos cinco passos na linha de ação: formação da força de trabalho; treinamento dos militares, que envolveu visitar os setores e os batalhões para explicar a importância de empregar a perspectiva de gênero no dia a dia do seu trabalho; troca de informações; inserção da perspectiva de gênero nos documentos e diretivas produzidas na missão; e, por fim, o engajamento e a aplicação no terreno, junto às comunidades. “Foi um ciclo completo. Tive a alegria de ver as equipes mistas, de homens e mulheres, trabalhando na proteção dos civis”, salientou.
Conhecimento do terreno
Uma parte fundamental do trabalho desenvolvido pela CC Márcia foi dimensionar e entender as áreas mais sensíveis da região e onde os grupos estavam localizados. O objetivo era documentar as características do terreno para assessorar os comandantes militares no melhor posicionamento da tropa.
“O assessor de gênero tem que estar no terreno, junto à população e ao contingente e não apenas dentro de um escritório”, afirmou. “Se eu sei que numa área há grupos armados recrutando crianças, preciso reforçar a atenção à rotina dos meninos, para entender de que forma a violação acontece e alertar a tropa para a necessidade de intervir.”
As ações passaram a ser realizadas mais próximas à comunidade local e foram desenvolvidos projetos com o intuito de diminuir as ameaças. “Acredito que quando há militares no terreno, conseguimos evitar as violações. A patrulha, de preferência formada por homens e mulheres, o engajamento, ouvir a comunidade, foram ações fundamentais na proteção dos civis.”
Dentre as principais dificuldades enfrentadas pela CC Márcia estava o baixo número de mulheres atuando na MINUSCA. “Eu tinha 3,7 por cento de mulheres. A média das missões é de 4 por cento, incluindo observadores militares, funcionários da equipe e tropa. [É uma] quantidade muito pequena, se considerada a importância das patrulhas mistas para a aproximação com as mulheres, principalmente com as que foram vítimas de violência sexual”, ressaltou. “A questão do idioma foi outro obstáculo de aproximação com a comunidade. Havia batalhões que não falavam francês, predominante na região.”
Apesar dos desafios, para a CC Márcia, a experiência em uma missão da ONU é inesquecível. “A cada dificuldade, mais força eu tinha para continuar lutando para ajudar as pessoas. Nunca fui tão feliz na minha vida. Sinto muita falta da África, é como se fizesse parte de mim, da minha história”, finalizou.