A delinquência colombiana se aproveitou da pandemia da COVID-19 para consolidar seu domínio na fronteira venezuelana, com a cumplicidade das forças de segurança da Venezuela. O grupo guerrilheiro Exército de Libertação Nacional (ELN), juntamente com outros grupos criminosos menores, está aproveitando a emergência humanitária que se vive na Venezuela, para se envolver no tráfico de pessoas e na exploração de menores, ao longo da fronteira com a Colômbia.
Esta situação está ocorrendo com a cumplicidade de membros das forças militares e policiais venezuelanas, disse àDiálogo, em 13 de agosto de 2022, Bram Ebus, pesquisador do International Crisis Group, um think tank de Bruxelas, Bélgica, dedicado a analisar áreas de conflito ao redor do mundo.
“O ELN durante a pandemia fez um grande avanço na fronteira e, com a ajuda dos serviços de segurança do Estado da Venezuela, eles retiraram [a gangue criminosa colombiana] os Rastrojos de La Fría e Boca de Grita, do estado de Táchira [Venezuela]”, disse Ebus. “Também em [departamento colombiano] La Guajira eles conseguiram mais controle ao derrubar algumas gangues […]“.
Ebus participou da elaboração de um relatório do Crisis Group, divulgado em 9 de agosto, que destaca a consolidação do ELN na área de fronteira, aproveitando diferentes atividades ilícitas, como o plantio e a colheita de coca ou a coleta de pagamentos por extorsão. Em todas, utilizariam mão de obra venezuelana, na maioria das vezes forçada, recrutada principalmente na fronteira, onde chegam venezuelanos fugindo da crise humanitária causada pelo regime de Nicolás Maduro.
Devido à sua presença crescente, o grupo guerrilheiro também domina os postos de fronteira informais. “O ELN é o que cobra pela travessia da fronteira”, afirmou Ebus.
O envolvimento do ELN e outras organizações criminosas no tráfico de pessoas na área limítrofe também é destacado em um relatório apresentado em julho pelo Departamento de Estado dos EUA.
De acordo com o relatório, funcionários dapolícia e das forças armadas da Venezuela“forneceram apoio e um ambiente permissivo para grupos armados não estatais que recrutaram crianças para conflitos armados e criminalidade forçada. Esses grupos armados não estatais cresceram através do recrutamento de crianças soldados e se envolveram no tráfico sexual e em trabalhos forçados”. O documento indica que o ELN instalou 36 acampamentos no setor venezuelano da fronteira com a Colômbia.
Outra organização que indica a existência de uma aliança criminosa entre esse grupo guerrilheiro e os militares venezuelanos é a Human Rights Watch. Em um relatório divulgado em fevereiro, relata que ambos estão envolvidos em “desaparecimentos, sequestros e recrutamento forçado” no estado de Apure, fronteira com o departamento colombiano de Arauca.
Escravidão sexual
Um dos problemas associados ao tráfico de venezuelanos é a posterior exploração em centros de prostituição ou em trabalhosforçados. “Para cada menina ou mulher que esteja na escravidão sexual, ou que sejalevada a grupos armados, há muito dinheiro envolvido”, disse à Diálogo Alejandra Vera, diretora da ONG colombiana Corporación Mujer, Denuncia y Muévete, que apoia os direitos das mulheres.
Segundo Vera, as mulheres são recrutadas na fronteira entre a Colômbia e a Venezuelapara redes de exploração sexual, com a cooperação de grupos armados. “A pornografia neste momento via webcam está faturando bilhões. Um dos territórios que mais exporta pornografia infantil e com mulheres é o Norte de Santander”, disse.
Para Ebus, a cumplicidade das forças de segurança do lado venezuelano dificultará o desmantelamento desses grupos. “É difícil imaginar como Bogotá e Caracas serão capazes de resolver estas questões de direitos humanos na fronteira, sabendo que muitas vezes os representantes do Estado, funcionários públicos locais e forças armadas policiais da Venezuela são cúmplices dessas redes de tráfico”, concluiu.