Os Estados Unidos e seus aliados estão delineando uma linguagem de apoio a um esforço internacional para adotar regras de conduta no espaço, disse à SpaceNews a Brigadeiro da Força Aérea dos EUA DeAnna Burt, do Comando Espacial dos EUA.
A Brig Burt é comandante do Componente Espacial da Força Combinada do Comando Espacial dos EUA, na Base da Força Aérea de Vandenberg, Califórnia. Ela declarou que o momentum internacional caminha para a adoção de um rigoroso conjunto de regras para tornar o espaço mais seguro e sustentável.
O Comando Espacial dos EUA está assumindo uma função central nesse esforço, em meio ao crescente temor sobre os testes com armas antissatélites da Rússia e preocupações de que a proliferação de satélites e dejetos esteja poluindo rapidamente a órbita da Terra.
A Brig Burt expressou que uma equipe de autoridades de Defesa e do Departamento de Estado dos EUA está esboçando uma linguagem sobre a posição dos EUA em uma resolução aprovada em dezembro pela Assembleia Geral das Nações Unidas, que requer “normas, regras e princípios de conduta responsável” no espaço. A ONU solicitou que os países forneçam dados até o dia 3 de maio para que sejam incluídos em um relatório a ser examinado pela Assembleia Geral da ONU no próximo verão.
O problema com as resoluções anteriores da ONU é que elas não eram obrigatórias, disse a Brig Burt. “Vamos preparar o que acreditamos ser uma linguagem de proposta que será apresentada à ONU e esperamos que resulte em uma resolução obrigatória”, disse ela. “Existem muitos trabalhos bons sendo feitos no cenário internacional.”
Durante décadas, houve apelos para que a ONU e outras organizações encontrassem uma forma de avançar à medida que mais nações passam a realizar operações espaciais. O Tratado do Espaço Sideral de 1967 ainda é a base das leis espaciais internacionais, mas os especialistas dizem que ele já está ultrapassado. Por exemplo, ele proíbe o uso de armas de destruição em massa no espaço, mas os países agora enviam espaçonaves de dupla utilização que podem ser usadas com objetivos pacíficos e militares.
Na última década, China e Rússia apresentaram propostas de tratados para banir armas no espaço, mas os Estados Unidos rejeitaram todas elas como inaceitáveis.
A resolução da ONU de dezembro – originalmente proposta pelo Reino Unido – se concentra em restringir atividades irresponsáveis ou potencialmente ameaçadoras e em reduzir os riscos de mal-entendidos e erros de cálculo. “O Reino Unido deu um passo à frente”, afirmou a Brig Burt. Os Estados Unidos estão trabalhando com o Reino Unido e com uma coalizão mais ampla que inclui Alemanha, Austrália, Canadá, França e Nova Zelândia.
Não são apenas os EUA e governos aliados que se preocupam com isso, segundo a Brig Burt. Proprietários e operadores de satélites privados de muitas nações “têm interesse próprio em manter o domínio seguro, sustentável e livre para que todos o utilizem”.
O Comando Espacial dos EUA tem especialmente uma grande desconfiança da Rússia, após os testes recentes de armas que podem ser utilizadas para atingir satélites na órbita baixa da Terra. Em 2020, a Rússia testou duas armas de ascensão direta. O país também testou um sistema co-orbital que os Estados Unidos acreditam tenha como alvo um satélite norte-americano de inteligência.
Para impedir esses tipos de atividades, declarou a Brig Burt, “queremos ver algo que seja de cumprimento obrigatório. E será algo com o qual todos possamos concordar”. Não é suficiente, disse ela, dizer que alguém é “mau ou irresponsável se não tivermos definido totalmente o que tais termos significam no cenário internacional”.
Modelo de domínio marítimo
Um modelo útil para as regras espaciais é o domínio marítimo, disse ela. “Houve muita exploração durante centenas de anos e nós estabelecemos normas que se tornaram leis quanto às regras marítimas. A forma como operamos no espaço precisa ter tipos muito similares de costumes e processos.”
“Houve muita exploração durante centenas de anos e nós estabelecemos normas que se tornaram leis quanto às regras marítimas. A forma como operamos no espaço precisa ter tipos muito similares de costumes e processos”, Brigadeiro da Força Aérea dos EUA DeAnna Burt, do Comando Espacial dos EUA.
Qualquer acordo precisa definir claramente o que constitui um comportamento ameaçador, hostil ou irresponsável, afirmou a Brig Burt. Com base nisso, uma nação pode decidir se uma determinada ação no espaço constitui um ato de guerra ou se pode ser solucionada através de sanções diplomáticas ou econômicas.
Os Estados Unidos não estão pedindo o banimento de armas específicas, disse a Brig Burt. “Chineses e russos já lançaram armas no espaço. Assim sendo, acho que já passou a hora de conversarmos sobre criar um regulamento em si, e por isso nos concentramos em normas de conduta.” Quanto às armas antissatélites, “não creio que possamos colocar esse gênio de volta na garrafa”.
O que se precisa é ter transparência, para que os países que colocam em órbita essas espaçonaves de duplo uso revelem o motivo desse destacamento. Se uma nação lança um veículo de serviço com um braço robótico “e ele estiver destinado a uma função dissuasiva ofensiva, então que assim seja”, desde que seja operado de forma segura e responsável, segundo ela. “O fato de eu lançar algo com capacidade ofensiva não significa que irei utilizá-lo, a não ser que haja uma razão para que eu defenda meus bens.”
Com mais nações agora envolvidas no espaço, há preocupações além do uso de armas, tais como segurança de voo e separação de trajetórias para que os satélites não colidam ou interfiram nos demais, declarou a Brig Burt, que passou 28 anos na Força Aérea dos EUA operando satélites. As preocupações com a segurança continuarão crescendo à medida que mais humanos começarem a ir para o espaço, acrescentou.
Todo acordo internacional também deveria responsabilizar quaisquer agentes que produzem detritos de longo prazo. “Essa é uma das maiores preocupações”, disse ela. “Precisamos definir o que são detritos de longo prazo, mas um exemplo nítido é o teste antissatélites da China em 2007. Ainda estamos rastreando destroços desde 2007.”
Ter consciência do que os outros países estão fazendo ajudará a atribuir iniciativas, disse a Brig Burt. Em situações onde alguém ameaça um satélite dos EUA, idealmente “queremos mostrar uma foto… e compartilhá-la na mídia nacional” da mesma forma como a Força Aérea mostra vídeos de campanhas de bombardeios aéreos.
No entanto, a maior parte da inteligência dos EUA sobre o domínio espacial é confidencial. A Brig Burt acrescentou que os líderes do Comando Espacial dos EUA estão trabalhando com a comunidade de inteligência para “tornar públicas as coisas sobre as quais precisamos conversar com o povo norte-americano”.