Pelo menos sete empresas chinesas contratadas pelo governo equatoriano para realizar obras públicas em setores como os de construção, mineração, telecomunicações e exploração de petróleo realizaram pagamentos a companhias consideradas fantasmas pelo Serviço da Receita Federal do Equador (SRI, em espanhol).
Essa descoberta é fruto de uma investigação realizada pelo jornal equatoriano El Universo, que comparou as bases de dados de empresas fantasmas publicadas em abril de 2019 pelo SRI com as declarações de renda apresentadas pelas empresas chinesas contratadas pelo país, entre 2010 e 2018.
Segundo Jorge Rodríguez, economista e representante da Comissão Nacional Anticorrupção do Equador, o uso de empresas fantasmas vem de longa data no país. O economista explicou que normalmente essas companhias são empregadas para lavar dinheiro, simular gastos, reduzir artificialmente os lucros e pagar comissões a funcionários por atos de corrupção.
“O problema começou na década de 1990 com os bancos que movimentavam o sucre e o dólar. Os empresários, então, colocavam seus motoristas ou assistentes à frente das empresas de fachada, para lavar dinheiro e obter vantagens com as taxas de câmbio. Essas práticas renasceram em 2007, como um meio de pagamento de propinas por corrupção. As empresas simulam recibos para cobrar quantias de dinheiro público. Elas faturam, cobram os valores e depois os repartem”, disse Rodríguez à Diálogo. “Também utilizam esse método para lavar dinheiro que necessariamente precisa passar pelos bancos; elas o fazem através de contas de empresas falsas. É um grande negócio, porque reduzem os lucros artificialmente, mas, na realidade, todos os recursos públicos são desviados para seus bolsos.”
Empresas chinesas
A investigação do jornal El Universo descobriu que sete companhias chinesas contratadas pelo governo fizeram cobranças por supostas transações realizadas com 84 empresas fantasmas. O montante foi de aproximadamente US$ 22 milhões.
As empresas chinesas envolvidas são: China CAMC Engineering, China International Water & Electric, China Gezhouba Group, Harbin Electric International, China National Electric Engineering, China Electronics Import & Export e as duas sucursais equatorianas da Sinohydro. As empresas fantasmas mais utilizadas foram a Construestilo S.A., Comexito S.A., Highstrategy S.A., Gotoconstru S.A. e Divinacompany S.A., segundo El Universo.
“Os chineses aprendem rapidamente quando se trata de corrupção; temos várias empresas desse país que utilizavam companhias especialmente criadas para roubar dinheiro do Estado. Dessa forma, várias empresas foram encobertas. Os contratos assinados incluíam cláusulas que restringiam o acesso à informação, o que favorece a corrupção, porque a sociedade civil não tinha possibilidades de triangular as informações”, garantiu Rodríguez.
Transparência nos contratos
O veículo de notícias online Ecuador en Vivo relatou no dia 6 de junho que entre 2008 e 2018 o Equador assinou 74 contratos com empresas chinesas por um valor aproximado de US$ 8 bilhões. “No entanto, o que causa inquietação com a proliferação dos investimentos do país asiático, que em 2007 eram de apenas US$ 7 milhões, é a não transparência das contratações, os termos de financiamento, os prazos e até mesmo a qualidade e as especificações dos materiais”, informa o diário.
Em uma inspeção realizada em novembro de 2018 na Coca Codo Sinclair, a maior central hidrelétrica do país, as autoridades equatorianas encontraram 7.648 fissuras nos distribuidores que injetam água nas turbinas e danos estruturais de mais de US$ 1 bilhão. A megaobra foi construída em 2016 pela companhia chinesa Sinohydro.
O Ecuador en Vivo acrescenta que “há antecedentes em outros países, especialmente os do eixo bolivariano: Bolívia, Venezuela, Nicarágua e Cuba. A empresa China CAMC Engineering que, de acordo com sua página na internet, realiza obras nas ‘áreas de engenharia industrial, agrícola, hidráulica, elétrica e de transporte’, é investigada há mais de dois anos pela Assembleia, pela Controladoria e pelo Ministério Público da Bolívia, com várias restrições de acesso à informação”.
O SRI do Equador começou a analisar os dados recebidos de seus investigadores. “Dessa maneira definiu quais foram as empresas criadas especificamente com essa finalidade e classificou como falsas aquelas que faturaram o Estado, mas nunca apresentaram suas declarações de renda”, declarou Rodríguez. “Esses casos foram detectados graças à exaustiva investigação de dados feita pelo governo.”
As empresas chinesas atuam no Equador em todas as áreas importantes para o desenvolvimento do país. “Todas essas contratações foram feitas no obscurantismo e agora aparece a utilização de empresas fantasmas. As empresas chinesas não demonstram ter princípios éticos e os funcionários corruptos sempre estarão lá para ajudar e ganhar dinheiro”, concluiu Rodríguez. “Não é justo que as empresas contratadas para melhorar as condições do país realizem movimentações financeiras para defraudar o Estado. Temos que exigir transparência; não importa se são empresas chinesas ou equatorianas, é preciso saber como nosso dinheiro está sendo usado.”