Ao longo de sua existência, o ser humano tem sido testemunha e protagonista da luta entre o bem e o mal. A história ilustra de diferentes perspectivas como o homem evoluiu e se transformou em um ser de conhecimento, ideais e interesses. Quando estes não são cumpridos ou satisfeitos, são estabelecidos diferentes mecanismos para obtê-los.
Neste contexto, o terrorismo não é um fenômeno novo; ele tem sido usado ou para exercer excessivamente o poder estatal ou para reivindicar interesses violentamente quando grupos de vários tipos se sentiram ameaçados ou afetados. O desequilíbrio psicológico não é um fator crítico para explicar o terrorismo, nem é uma multidão enfurecida. Ao contrário, é um fenômeno ligado a situações políticas importantes em diferentes períodos da história.
Thucydides, o pai da historiografia científica, ou seja, uma história baseada na coleta de fatos com evidências e análise de causa-efeito, em suas crônicas das Guerras do Peloponeso já descreve os fatos históricos de uma luta por interesses entre duas polis gregas; ele assim germina conceitos básicos de relações internacionais e segurança.
Segundo a teoria contratualista, as pessoas passam do “estado de natureza” para um “estado de sociedade”, que é explicado por um “contrato” assinado entre os membros de uma sociedade e seu estado, no qual eles aceitam a limitação de suas liberdades em troca de um sistema legal que garanta sua sobrevivência e coexistência na mesma sociedade. As condições e características destas relações são claramente explicadas em cada uma das abordagens adotadas por Hobbes, Locke e Rousseau. Assim, o Estado fornece segurança, entre outras coisas, em troca da limitação das liberdades e do cumprimento das leis.
Mariano César Bartalomé, PhD em relações internacionais, em seu artigo El Estado moderno frente al desafío de un escenario de seguridad internacional de características postwestfalianas, escreve:
O conceito de segurança deve ser entendido de duas maneiras: como um “estado de coisas” e como uma “ação” destinada a alcançá-lo. No primeiro caso, é uma situação ideal que se apresenta como um objetivo negativo, caracterizado de forma simplificada por uma “ausência de ameaças”, em referência a fatores potenciais de danos plausíveis, além da existência – ou não – de uma vontade hostil que queira materializá-los. Em outras palavras, sem distinção entre ameaças em si ou meros riscos, uma vez que as doutrinas militares tendem a discriminar. O segundo significado, entretanto, refere-se ao conjunto de medidas e políticas conducentes a esta situação ideal (Bartolomé, Revista Estudios en Seguridad y Defensa 3(5): 8-13, 2008).
Neste contexto, o Estado pode contribuir para uma percepção de segurança ou pode agir para obtê-la. Agora, surge a questão se esta percepção e ação podem ocorrer dentro e fora do Estado, e a resposta óbvia é sim, mas existe uma linha tênue entre o interno e o externo, que gerou dois conceitos inter-relacionados que proporcionam este bem público: segurança e defesa.
As constituições políticas da maioria dos Estados prevêem o controle interno pelas forças policiais sob o conceito de “segurança”; e o controle das ameaças externas à sua soberania pelas forças armadas sob o conceito de “defesa”.
Há inúmeras discussões acadêmicas sobre esta questão, assim como várias leis e instrumentos que operacionalizam os conceitos de segurança e defesa em cada país. O cumprimento dessas leis, regulamentos e normas determina o Estado de Direito, que pode ser definido da seguinte forma:
Em seu significado mais simples, é o Estado sujeito à lei, ou seja, o Estado sujeito à ação integral da lei, da maneira proclamada há 200 anos pelos constitucionalistas americanos quando falavam de um governo de direito e não de homens, ou postulada pelos revolucionários franceses que, inspirados pelas idéias da Enciclopédia, proclamavam o Estado de direito como um governo de leis e não de homens, inspirado pelas idéias do enciclopedismo, declarou que il n’y a point en France d’autorité supérieure a celle de la loi (não há autoridade superior na França do que a da lei). (Borja, Enciclopédia de Política, 2018)
A defesa, na maioria dos casos, limita-se aos atores interestatais, mas surgem outros que são de natureza não estatal, mas que têm a capacidade de atacar os Estados, suas sociedades e habitantes. Este é o caso do terrorismo e sua escala de violência com a qual busca atingir seus objetivos políticos. Até que ponto essa ameaça estatal vai além das capacidades das forças policiais e seus equipamentos e cai na resposta estatal com as capacidades das forças militares? O que dizem as constituições de cada país sobre a questão de exceder as capacidades das forças policiais? Qual é a natureza, doutrina e equipamento das forças policiais e militares em cada país? Que regulamentações existem com órgãos supranacionais regionais que observam esta relação e o impacto das decisões soberanas em outros países? Todas estas perguntas devem ser respondidas antes de tentar analisar a melhor resposta à ameaça terrorista dentro da estrutura do Estado de direito.
Outra questão controversa é o risco de que, mesmo que o Estado de Direito seja cumprido, possam ocorrer casos de securitização em que os direitos e garantias constitucionais sejam violados. O conceito de securitização foi aperfeiçoado ao longo do tempo e pode ser definido como:
O posicionamento através do discurso ou atos discursivos (geralmente proferidos por um líder político), de uma situação particular ou ator como uma ameaça à sobrevivência de um objeto de referência e que, uma vez legitimado por um público relevante, permite a imposição de medidas de emergência fora dos canais políticos tradicionais (Alcalá, Alejandro, US Invasion of Iraq: The Securitisation of Conflict, www.geic.cm.ar, 2016).
Caso a securitização seja inadequada, é possível que um dos valores mais sagrados da democracia, a liberdade, possa ser violado por políticas antiterroristas, nas quais qualquer cidadão é presumido terrorista. É daí que vem o conceito de enfrentar a ameaça terrorista com valores democráticos, pois quando a resposta é frágil, há o risco de se ter um Estado falhado, e quando a resposta é excessiva, pode gerar as características de um Estado autoritário, criando assim razão e justificação suficientes para as ações terroristas. Por outro lado, enfrentá-la legalmente e cumprir os preceitos de uma democracia liberal significa que a proteção dos direitos e liberdades dos cidadãos não é violada e que as ações são tomadas de acordo com a lei.
Para analisar o tipo ideal de resposta, seja com as forças policiais, sua inteligência e meios judiciais ou com o poder dos militares, será necessário voltar às ondas terroristas de Rapoport – Professor Emérito de Ciência Política da Universidade da Califórnia – e especificamente à terceira ou chamada “Nova Esquerda” (Rapoport, 2004, p.58), na qual foram gerados grupos guerrilheiros que criaram uma zona cinzenta não apenas entre eles e o terrorismo, mas também na resposta que os Estados deveriam ter.
No caso dos grupos armados que eram considerados terroristas na América do Sul, a maioria deles eram grupos com armas letais e de alto calibre, normalmente usadas na guerra convencional entre estados. Isto fez com que a função da polícia de controle cidadão fosse sobrecarregada e dois cenários foram criados: o primeiro foi a militarização da polícia, e o segundo envolveu as forças armadas com seu poder militar. Em ambos os casos houve excessos, mas a solução final para estes problemas não foi o tipo de resposta, mas a perda de motivação e racionalidade destes grupos, que, sem ter cumprido seus objetivos, deixaram de receber apoio externo com a queda do Muro de Berlim e o fim da Guerra Fria.
Os Estados tiveram a oportunidade de viver em ambos os cenários e sua resposta teve que ser proporcional ao nível da ameaça, que é o primeiro fator que deve ser levado em conta para analisar se foi um crime com sua respectiva resposta judicial e forças policiais, ou se foi uma ameaça na qual as forças militares tiveram que agir. Agir sem avaliar adequadamente a ameaça levaria ao fracasso da missão ou ao uso excessivo da força.
Um segundo fator seria o tipo de legislação que determina a configuração de um crime ou a violação da soberania de cada país. Atuar fora da estrutura constitucional sempre trará desvantagens e nenhum benefício ou vantagem para o tipo de resposta.
O terceiro fator que poderia ser analisado dentro desta onda é a permeabilidade que o efeito da nova esquerda teve através das fronteiras de cada país e sua designação como insurgente, guerrilheiro ou grupo terrorista. Isto levou à expansão do fenômeno terrorista, pois a legislação de alguns países permitiu que se tornassem zonas de encenação, treinamento ou logística. Quando a ameaça se torna regional e pior global, as estratégias de resposta devem ser combinadas, para que os esforços não sejam isolados. Caso ocorram respostas isoladas, elas trabalharão contra a solução do problema terrorista.
Em resumo, é a natureza da ameaça, o alcance das leis e a decisão política que determinará se o problema terrorista é um crime ou uma violação da soberania de cada país, e o tipo de polícia ou força militar que restaurará a percepção de segurança da sociedade.
Em conclusão, não há receita para determinar o tipo de contra-terrorismo no século XXI. O que é claro é que uma resposta fraca, ou excessivamente forte que não seja enquadrada pelo Estado de direito, terá sérias implicações para os Estados, a começar pela justificativa do ato terrorista. Se forem utilizadas forças policiais ou militares, elas devem ser preparadas, treinadas e doutrinadas para serem tão flexíveis quanto a ameaça exige; em outras palavras, quando se trata da defesa do Estado, o exercício do monopólio da força, enquadrado nas respectivas leis, é a forma de resolver o problema terrorista. Será o Estado que atenderá às necessidades, interesses e aspirações de cada povo, mas será o próprio Estado que lhes proporcionará segurança como um bem público.
BIBLIOGRAFIA:
Rapoport, D. C. (2004). As quatro ondas de terror insurgente e o 11 de setembro. Em F. Reinares e A. Elorza (Eds.),
Alcalá, Alejandro, Invasión norteamericana a Irak: La seguritización del Conflicto, www.geic.cm.ar, 2016.
Borja, Rodrigo, Enciclopédia da Política, 2018
Bartolomé, Mariano, Estudios en Seguridad y Defensa, El Estado moderno frente al desafío de un escenario de seguridad internacional de características postwestfalianas, 2008.
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